O eclipse do Sporting no caso E-toupeira. De assistente à não comparência no julgamento
Porto Canal
Após cinco adiamentos e muitos avanços e recuos, chegou, esta quarta-feira, ao fim um processo cuja decisão parecia não querer ver a luz do dia. Inicialmente agendada para 4 de novembro, a leitura do acórdão do processo E-toupeira prolongou-se até 22 de fevereiro. Paulo Gonçalves, o ex-assessor jurídico do Benfica, foi condenado a dois anos e seis meses de pena suspensa pelo crime de corrupção ativa. Por sua vez, José Augusto Silva foi condenado a cinco anos de prisão também com pensa suspensa, tendo Júlio Loureiro sido absolvido.
O Benfica, apesar de ausente no banco dos réus, ao ficar fora de julgamento, é assim o ator principal em toda a história. Contudo, o vizinho da segunda circular, Sporting, tem também envolvimento em todo este denso e moroso enredo, ainda que em segundo plano, ao não comparecer ao julgamento que confirmou as suspeitas de corrupção praticadas.
Março de 2018: E-toupeira vê a luz do dia e primeira detenção na Luz
A 6 de março de 2018, a Polícia Judiciária confirma a detenção de Paulo Gonçalves sob suspeita de ter subornado três funcionários judiciais para lhe fornecerem dados processuais sigilosos. Nascia assim o caso “E-Toupeira”, que levou Luís Filipe Vieira, quatro dias depois, a anunciar a criação de um gabinete de crise com o propósito de contra-atacar pessoas e entidades que colocassem em causa “o bom nome do Benfica”.
Nesse mês, a revista ‘Sábado’ avança que, depois de buscas da PJ ao Estádio da Luz, foram descobertos no gabinete de Paulo Gonçalves vários documentos de processos em segredo de justiça e também "pesquisas efectuadas na base de dados da Segurança Social (…) referentes a Hernâni de Jesus Fernandes", antigo árbitro assistente, actualmente assessor do Sporting. Nas mesmas buscas, segundo o auto do Ministério Público, foram encontrados "dados da Segurança Social" relativos ao clube de Alvalade.
José Augusto Silva foi apanhado em ações de vigilância da Polícia Judiciária no Estádio da Luz. O oficial de justiça era acompanhado por Paulo Gonçalves nas zonas VIP
Segundo um auto do Ministério Público, José Augusto Silva, técnico do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, era suspeito de passar informações confidenciais ao jurista da SAD das 'Águias'.
Sporting constitui-se assistente no processo e-toupeira
Perante este cenário, o Sporting reforçou os argumentos para a sua constituição como assistente no processo e-Toupeira, fase que recebeu luz verde. Ainda com Bruno de Carvalho na presidência, o clube de Alvalade constituiu-se assistente não só nesse caso, como também nos processos dos emails e vouchers, também envolvendo o Benfica.
De destacar que um assistente tem poderes que lhe permitam intervir directamente no andamento do processo. Ao fazê-lo, assume uma posição de colaboração com o Ministério Público, entidade a quem compete investigar, deduzir acusação e sustentá-la efetivamente.
O assistente tem os direitos de intervir no inquérito e na instrução, oferecendo provas e requerendo as diligências que considere necessárias, deduzir acusação independente da do Ministério Público, ou interpor recurso das decisões que o afetem.
Varandas considera E-toupeira "uma vergonha para o futebol português"
Na ressaca dos acontecimentos iniciais que marcaram todo o processo, nomeadamente a acusação do Minisitério Público a dois funcionários judiciais (Júlio Loureiro e José Nogueira Silva) a SAD do Benfica e um seu colaborador (Paulo Gonçalves) de vários crimes, incluindo corrupção, favorecimento pessoal, peculato e falsidade informática, Frederico Varandas, à altura candidato à presidência do clube de Alvalade, teceu duras críticas ao Benfica.
"É uma vergonha para o futebol português. Vou exigir zero de suspeição internamente, para mim e para os meus. Acredito na justiça portuguesa, isto ainda é só o início. A justiça tem de fazer cumprir a lei, doa a quem doer e seja a quem for", afirmava Varandas, fazendo mira ao rival encarnado.
Contudo, com o desenrolar do processo, a posição ativa do clube de Alvalade foi, paulatinamente, transformando-se na de mero espectador, completamente resignado com as decisões judiciais que foram surgindo.
Sporting não recorre da ilibação da SAD do Benfica
Depois de se ter constituído como assistente no processo, o Sporting decidiu não recorrer da decisão do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), de não levar a SAD do Sport Lisboa e Benfica a julgamento pelos 30 crimes de que era acusada.
Sporting, presidido por Varandas, não recorreu de decisão do processo e-toupeira
Segundo despacho da juíza de instrução criminal Ana Peres, só o Ministério Público e Perdigão da Silva, ex-árbitro e assistente no processo, apresentaram recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa.
Uma decisão que acabou até por surpreender os próprios advogados do clube da Luz, uma vez que, na altura da decisão da juíza Ana Peres, fonte oficial dos ‘leões’ considerou a deliberação como “incompreensível” e sublinhou o “direito de recorrer do teor da mesma”, tudo isto “com o objetivo de repor a verdade desportiva”.
Sporting não comparece ao julgamento
Já na reta final do processo, e após ter ficado designado como o representante do conjunto de assistentes que se constituíram neste processo, o Sporting não compareceu ao julgamento, no qual Paulo Gonçalves foi condenado a dois anos e seis meses de pena suspensa pelo crime de corrupção ativa.
Mais do que faltar à audiência, a inação leonina impediu todos os restantes assistentes na mesma condição de participarem no julgamento. Assim além de ter uma atitude passiva neste processo, impossibilitou que outros tomassem parte ativa.
Mesmo após a leitura do acórdão do processo E-Toupeira, e face ao acumular de práticas duvidosas que pairaram sobre as conquistas de um eterno rival, o Sporting escusou-se de qualquer comentário ao defecho do processo, posição que mereceu críticas dos adeptos.
Juve Leo lamenta “que não haja nenhum comunicado sobre o E-Toupeira”
A claque do Sporting reagiu com indignação, acusando o clube de não emitir “nenhum comunicado sobre o E-Toupeira ou as escutas da TVI, onde o Sporting é implicado diretamente e mais uma vez sai lesado prejudicado a todos os níveis”, pode ler-se.
Uma perceção de inércia e inoperância, no seio sportinguista, do clube presidido por Frederico Varandas, numa altura em que direção e claques estão de costas voltadas.