Prometeu-se estratégia, mas Pêgo Negro continua "esquecido” no Porto Oriental

Prometeu-se estratégia, mas Pêgo Negro continua "esquecido” no Porto Oriental
Foto: André Arantes | Porto Canal
| Porto
Ana Francisca Gomes

Os novos planos para a urbanização da zona de Campanhã avançam a todo o gás e com eles chegam novos projetos para colorir esta região cinzenta da cidade do Porto. As atenções, contudo, parecem não ter passado pelo Pêgo Negro, para onde a câmara municipal do Porto tinha anunciado uma estratégia urbanística em 2015.

Quem está na entrada nascente do Parque Oriental do Porto e decide percorrer a rua do Pêgo Negro, imediatamente ao lado, está longe de acreditar que o amontoado de casas e ‘barracos’ improvisados em chapa chegaram um dia a acolher alguém.

Porto Canal

Outrora vibrante, aquela rua em paralelo foi dizendo adeus aos seus moradores, mas nem todos a abandonaram. Uma peça de roupa estendida ao sol vai denunciando um ou outro resistente que ainda habitam nesta mancha urbana esquecida e periférica à cidade, junto à invisível fronteira com Gondomar, e que é espelho de muitas outras idênticas que pintam a paisagem da freguesia de Campanhã.

Camuflada no meio de sobreiros e casas devolutas, estão as quatro paredes do “Senhor Braga”, que se mudou para aquela zona apenas há meia dúzia de anos e cujo apego é o mesmo de quem lá passou a vida inteira.

No meio de tantas casas sem gente, surge como um “guardião” do Pêgo Negro. Plantou um conjunto de palmeiras na zona que circunda a sua casa, “para isto ficar mais apresentável” e enxuta “quem se tenta apropriar das casas abandonadas”, confidencia, com orgulho.

O sítio onde pernoita não tem condições, mas o peso de ter que sobreviver com uma reforma de pouco menos de 300€ não lhe permite melhor. Foi o próprio que fez as obras que a sua casa e a da filha mais nova, ao lado, necessitavam. Não tinham casa de banho e o quarto do neto não tinha condições para o acolher. “Ainda andaram a falar que a câmara ia expropriar estes terrenos aos proprietários, só que nada aconteceu”, lamenta.

Nesta zona, agora quase deserta, continuam bem expostas as marcas de miséria, pobreza habitacional e exclusão social que um dia encheram a rua de Pêgo Negro. Durante muito tempo, eram arrendadas casas incapazes de oferecer o mínimo de condições. A autarquia ia dando soluções e realocando as pessoas em casas camarárias, contudo o esforço caía sempre por terra: as habitações, pertencentes a privados, eram arrendadas a novas famílias. Os relatos eram de paredes com tanta humidade que nasciam cogumelos, buracos por onde entravam ratos do exterior e falta de saneamento.

Porto Canal

Em 2015, a autarquia do Porto, já liderada por Rui Moreira e com Manuel Pizarro à frente do pelouro da Habitação e Ação Social, avançava com um estudo transversal sobre esta situação e prometia que Pêgo Negro teria uma estratégia. No ano seguinte, a empresa municipal Domus chegou mesmo a contratar um escritório de arquitetura para desenvolver um projeto para uma “ilha” municipal situada no número 351 daquela rua.

Quem lá passa, contudo, facilmente constata: nem projeto, nem estratégia. No Pêgo Negro continua a esperar-se por uma solução definitiva.

Fonte do gabinete Cannatà & Fernandes Arquitectos, que ficou responsável por desenhar aquele espaço, esclareceu ao Porto Canal que o projeto chegou a ser feito e entregue à Câmara do Porto, que nunca lançou concurso. O Porto Canal contactou a Câmara do Porto, que não deu qualquer esclarecimento sobre o assunto.

 

“Isto é uma Faixa de Gaza, está muito perigoso”

Mais abaixo na rua, a apanhar sol junto ao rio, estão Maria e José (nomes fictícios), cujas memórias daquilo que o Pêgo Negro um dia foi são suficientes para encher um livro.

Os dois, que por lá resistem, lamentam que “restem apenas umas 50 pessoas - se tanto - numa zona onde já moraram entre duas a três mil pessoas”. Maria mora há 84 primaveras junto ao rio Tinto, que atravessa a zona de Campanhã, e lembra como a zona já foi mais viva. “Só na nossa rua tínhamos cinco mercearias”.

A rua do Pêgo Negro, diz quem lá mora, já foi um sítio agradável para se viver, mas a demolição do Bairro do Aleixo e a construção do Parque Oriental atraíram a droga e a criminalidade para aquela zona, lamentam os poucos moradores, que a descrevem como sendo “uma Faixa de Gaza”.

Desde a megaoperação da Polícia de Segurança Pública (PSP) nos bairros da Pasteleira Nova e Velha e da “operação de limpeza” da Polícia Municipal a um acampamento lá localizado, o consumo e tráfico de droga acentuou-se na zona do Pego Negro.

Localizado entre o Bairro do Cerco e o Bairro do Lagarteiro, que têm sido dos principais destinos, também o Pêgo Negro sentiu efeitos. Sem a prometida estratégia urbanística da Câmara do Porto, esta zona periférica da cidade junta-se às mais centrais, como a Sé ou Ramalde, como pousio para quem procura satisfazer o vício da droga.

 
 
 
Ver esta publicação no Instagram
 
 
 

Uma publicação partilhada por Porto Canal (@porto.canal)

+ notícias: Porto

Incêndio em colégio no Porto já está extinto

O incêndio que deflagrou ao início da tarde de deste domingo no Colégio Flori, no Porto, "já está extinto" e em fase de rescaldo e ventilação, adiantaram ao Porto Canal as autoridades.

Last Folio: as duras memórias do Holocausto 

O Museu e Igreja da Misericórdia do Porto acolhem a exposição internacional LAST FOLIO acompanhada por um documentário, que mostra as memórias do Holocausto. A exposição do fotógrafo Yuri Dojc e da cineasta Katya Krausova, pode ser visitada até novembro.

Nova Linha do Metro do Porto avança. Veja aqui as primeiras imagens 

As obras da nova Linha do Metro do Porto, Linha Rosa (G), que assegurará a ligação entre São Bento e a Rotunda da Boavista já avançaram. Esta extensão terá 3 km e 4 estações subterrâneas (duas adjacentes às já existentes São Bento e Casa da Música).