Especial Eleições Galiza: Autonomia permitiu uma revolução Industrial
Henrique Ferreira
Este texto é parte integrante da Grande Reportagem do Porto Canal “Galiza: Espelho da Autonomia”, publicada a 16 de Março de 2023.
De Santiago de Compostela, partimos à descoberta da Corunha, zona portuária e um dos grandes pólos industriais da Galiza. O ritmo citadino do centro contrasta com a calma das praias de areia branca e fina. A cidade é uma das maravilhas da região autónoma, diz quem lá mora e quem por lá passa.
Além dos muitos encantos naturais, históricos e culturais, a Corunha é também conhecida pela indústria e pelas imponentes fábricas. Estão um pouco por todo o lado, mas sobretudo na pequena vila de Arteixo, a pouco mais de 13 km da cidade.
Passa pouco das oito da manhã quando chegámos. A vila ainda está a acordar, mas nos cafés já se sente o fervilhar de um novo dia de trabalho. A maioria dos habitantes trabalha nas indústrias, que a partir da segunda metade do século XX começaram a fixar-se na zona. Grande parte dedica-se ao têxtil, a joia da coroa do setor transformador da Galiza.
A Inditex, considerada uma das mais valiosas redes de fast-fashion do mundo, nasceu na Corunha e ali se mantém de forma orgulhosa.
Nasceu em 1985 pelas mãos de Amâncio Ortega e detém atualmente as marcas Zara, Zara Home, Pull&Bear, Massimo Dutti, Bershka, Stradivarius, Oysho e Tempe. O empresário é uma figura incontornável da história da Galiza, mas tentou sempre passar despercebido. As fotografias públicas contam-se pelos dedos das mãos e as entrevistas não existem. Os analistas acreditam que o segredo é precisamente um dos ingredientes para o sucesso da empresa que, em 2021, lucrou mais de três mil milhões de euros.
“O caso da Inditex é muito curioso para os investigadores, mas não há dúvidas que é um império que só foi crescendo com o passar do tempo”, afirma Maria Bastida, professora de economia da Universidade de Santiago de Compostela, que não tem dúvidas de que a empresa tem ajudado a elevar a região da Galiza.
A opinião é partilhada por Alberto Rocha, presidente da Confederação de Indústrias Têxteis da Galiza (Cointega). O empresário reforça, no entanto, que “para o grupo Inditex, o panorama político não foi relevante”, uma vez que Ortega “conseguiu tudo com os seus próprios meios”.
Apesar disso, Alberto Rocha garante que “para o resto do setor têxtil ter uma administração de tipo autonómico foi muito vantajoso”. Para o responsável da Cointega, antes de 1980 “era impensável que na Galiza se criassem empresas como as que se criaram, marcadas pela eficácia na logística, quando a região está num canto” da Europa.
O setor têxtil é um dos exemplos do desenvolvimento da Galiza no pós-autonomia. Mas olhemos os números. A região deixou de ser uma das mais pobres e tornou-se na terceira comunidade autónoma de Espanha em que o PIB per capita mais cresceu. De 1894€ em 1980, o indicador explodiu para 21.730€ em 2020, ultrapassando Portugal e aproximando-se da média espanhola.
Fica claro que a autonomia transformou a região e contribuiu para a alteração da sua estrutura produtiva, que passou a ter os serviços e sobretudo a indústria como alavanca para o desenvolvimento económico. As exportações de mercadorias, por exemplo, dispararam 15 anos depois da autonomia, em 1995, já representavam 15,57% do PIB. O valor foi crescendo ano após ano, e a partir do século XXI superou os valores médios registados em Espanha e em Portugal. Em 2020, mais de 35% do Produto Interno Bruto Galego vinha de exportações.
22 milhões de “palancas” que revolucionaram a Galiza
A viagem segue agora novamente para sul, em direção a Pontevedra. É lá que encontramos Carlos Lopéz, empresário têxtil que, em tempos, chegou a cruzar-se com Amâncio Ortega nas feiras de moda em França e Itália. É proprietário da Foque Kids&Clothes, uma pequena marca de vestuário para crianças, feita sobretudo à base de malhas e lãs. A sua empresa não conseguiu crescer como a de Ortega, mas é um exemplo vivo da forma como a resiliência dos empresários galegos contribuiu para o desenvolvimento da região.
“Para ser grande começa-se sendo pequeno, porque toda a indústria têxtil começa com uma costureira que devagarinho inicia a produção”, afirma Carlos, que destaca a ajuda dada pelo governo regional às empresas. “Ajudaram-nos muito, sobretudo com a promoção. Deram-nos a possibilidade de estarmos nas feiras internacionais e divulgar o nosso trabalho.”
Mas o desenvolvimento económico e empresarial da Galiza não se deveu apenas à gestão interna dos recursos. Rafael Bargiela, historiador, lembra que “a integração na União Europeia e os fundos estruturais marcaram um antes e um depois na região.”
Entre 1986 e 2020 chegaram à Galiza mais de 22 mil milhões de euros de fundos europeus. O impulso económico permitiu que, entre 2007 e 2009, a região integrasse a lista das mais desenvolvidas da Europa.
“A verdade é que são alavancas”, afirma também, sem hesitar, a economista Maria Bastida. Apesar disso, garante que “é preciso saber utilizar os fundos e colocá-los nos lugares certos para que frutifiquem”. Para a professora universitária, foi isso que conseguiu fazer a Galiza, que “teve capacidade para adaptar os fundos às características do território”.
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