“Chegou a altura de discutir a Avenida da Ponte”
Ana Francisca Gomes
A Câmara Municipal do Porto vai, ao longo do ano de 2024, iniciar um conjunto de discussões com académicos, arquitetos e urbanistas sobre o “problema da Avenida da Ponte”, na Sé. A ideia, explica o vereador Pedro Baganha, é perceber quais são os “futuros que se pretendem para todo aquele território”.
A pergunta era apenas sobre o destino do Mercado de São Sebastião – cuja demolição foi avançada pelo Porto Canal, este sábado -, mas o vereador com o pelouro do Urbanismo e Espaço Público, Pedro Baganha, considera importante resolver o problema a uma escala mais vasta: “Eu acho que está a chegar a altura de a cidade do Porto abordar um problema que se arrasta desde a década de 1940, que é o que fazer à Avenida da Ponte.”
Quem o vê do terreiro da Sé, percebe que o Mercado de São Sebastião insere-se numa área de baixa densidade, num vazio pouco normal no centro das cidades. Na verdade, este vazio é uma “ferida” já antiga no Porto, que resultou de um conjunto de demolições do casario, em 1948, com vista à abertura de uma via que permitisse uma rápida circulação automóvel entre o tabuleiro superior da Ponte Luiz I, então principal entrada rodoviária na cidade, e a Estação de S. Bento. Arrasou-se todas as casas que apareciam pelo caminho e abriu-se a Avenida Dom Afonso Henriques, conhecida como “Avenida da Ponte”.
“Foi uma operação que hoje seria absolutamente impensável, de uma violência total”, relembra o urbanista.
Ficou ali uma cratera entre a Rua do Corpo da Guarda e a Sé do Porto. O Mercado de São Sebastião surge no meio, perdido. Muitos arquitetos desenharam planos para preencher o vazio, incluindo Álvaro Siza, que foi autor de um primeiro plano em 1968 e outro em 2000, no âmbito da Porto 2001 – Capital Europeia da Cultura. Mas todos os planos ficaram na gaveta. O mercado foi deixado naquele lugar enquanto nenhuma intervenção maior avançava.
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Falta “cumprir cidade”
O contexto desta zona é complexo. E é por isso que Pedro Baganha considera que não se pode pensar apenas no futuro do mercado, mas no futuro conjunto daquela área que “carece de consolidação”. “Estamos em pleno Centro Histórico, estamos em Património da Humanidade, e é quase paradoxal termos nesta zona uma ferida aberta há tanto tempo.”
“O que falta ali fazer do meu ponto de vista é cumprir cidade, é fazer cidade, é criar tecido. Quando temos uma ferida, esta vai cicatrizando e a pele vai recuperando. É o que precisamos de fazer ali, é recuperar esse tecido de tal forma que a cidade ganhe a coerência perdida”.
Esta solução, contudo, é um problema de “médio prazo, de cinco ou dez anos”, ressalva. Mas com as próximas eleições autárquicas a serem já no próximo ano de 2025, como é que se garante que esta vontade de se pensar o que fazer na Avenida da Ponte não se vai perder entre executivo, como outrora aconteceu com os planos desenhados?
“Há sempre esse perigo”, não esconde o vereador eleito pelo movimento independente de Rui Moreira. “Por isso é que eu acho importante que esta decisão seja tomada pelas forças vivas da cidade. Que se tente criar o maior consenso possível. Nunca há unanimidade - e ainda bem que não há - mas parece-me que a única forma de não corrermos esse risco é chegarmos a um conjunto de princípios e ideias que sejam perfilhadas pela maior parte da população, ou pelo menos dos representantes da população, das forças políticas que têm assento na assembleia municipal.”
Uma solução pode ser avançar-se para a concretização de um plano de pormenor, para se garantir que o mesmo é cumprido. “É o possível e o desejável, até porque o tempo das cidades não é o tempo dos ciclos políticos. A cidade tem uma longevidade e uma velocidade que não se compagina com estes curtos períodos de quatro anos. Por isso é que o consenso é importante e a discussão é importante e sem ela corremos esse risco.”