Sala de consumo vigiado do Porto "superou tudo o que era expectável inicialmente"
Porto Canal/Agências
A coordenadora do Programa de Consumo Vigiado do Porto disse esta terça-feira que a sala a funcionar há um ano superou as expectativas mas revelou ser necessário reforçar a equipa médica com especialistas de psiquiatria e psicopatologia
“Esta experiência superou tudo o que era expectável inicialmente”, afirmou, em declarações à Lusa, a coordenadora Diana Castro.
A candidatura previa uma adesão de 1.000 pessoas ao programa, valor “bastante otimista”, e que foi superado ao fim de nove meses de funcionamento. Desde a abertura, em 24 de agosto de 2022, e até maio, foram admitidos 1.665 utilizadores no espaço.
“Este número continua a aumentar. Quando saírem os resultados dos 12 meses do programa, estes resultados vão ser superiores”, afirmou.
Outra das “previsões otimistas” apontadas pela equipa foi a realização, em média, de 160 consumos por dia, valor que foi “largamente ultrapassado”, com dias em que se registaram 300 consumos.
Com a estrutura montada para receber um número inferior de utilizadores, rapidamente se verificou que o espaço “não era suficiente e não respondia às necessidades da população que, entretanto, foi chegando”.
“Isso, por um lado, revela o sucesso da intervenção que foi feita e também a necessidade que existe de ter uma resposta destas na cidade, mas também revelou dificuldades da equipa técnica que não estavam previstas na gestão de tamanha afluência”, observou Diana Castro.
Com dois enfermeiros, um técnico psicossocial, um técnico de pares, um vigilante e um auxiliar de limpeza a tempo inteiro, reforçar a equipa médica com especialistas de psiquiatria e psicopatologia, também a tempo inteiro, “é uma necessidade fundamental num programa destes”.
“Há muitas situações de doença psiquiátrica ou psicopatologia associada a este abuso de consumo de substâncias que precisam de acompanhamento”, referiu a coordenadora.
O reforço do apoio psicológico e psiquiátrico permitiria também ajudar a lidar com a “frustração e angústia” diária dos consumidores, fruto da dinâmica, volatilidade e violência do território onde estão inseridos.
“A dinâmica do bairro nunca é a mesma, ou porque vem um novo traficante, ou porque vem a polícia, ou porque deixa de haver substância, ou porque está chuva ou porque está calor. As pessoas valorizam a resposta que ali temos, mas também trazem consigo, para dentro do espaço, não só as necessidades, mas a sua amargura e a frustração que vivem lá fora”, referiu.
E acrescentou, “muitas vezes, a equipa técnica tem de servir como uma espécie de almofada a estes embates”.
Na sala de consumo, que é considerada pelos consumidores “o único espaço” na cidade onde podem entrar, a equipa técnica é a “última linha da repercussão dos ciclos de violência que existem no exterior”.
“O apoio psicológico e psiquiátrico é importante, mas também é importante investir numa resposta vasta da cidade em termos sociais, nomeadamente, no que diz respeito à habitação. Temos uma vasta percentagem de pessoas que estão em situação de sem-abrigo e sem teto. São pessoas que diariamente estão sujeitas a insegurança e violência sem qualquer retaguarda social”, acrescentou.
Instalada na ‘Viela dos Mortos’, a sala de consumo amovível começou a funcionar a 24 de agosto de 2022 sob a gestão do consórcio ‘Um Porto Seguro’ por um período experimental de um ano.
Uma portaria publicada a 10 de agosto em Diário da República avançou já o lançamento do concurso público para a gestão da sala de consumo vigiado fixa no Porto, cuja dotação ascende a 460 mil euros.
Com a abertura deste concurso, o programa de consumo vigiado deixa de ser um projeto-piloto e passa a ser uma resposta financiada pelo Ministério da Saúde, através do SICAD.