Ex-padre da Marinha Grande quer criar fundo de apoio às vítimas de abusos sexuais
Porto Canal / Agências
Um ex-padre da Marinha Grande, na diocese de Leiria-Fátima, lançou uma petição pública exigindo que a Igreja Católica em Portugal crie um fundo de apoio às vítimas de abusos sexuais na instituição.
Nelson Araújo, na petição dirigida ao Núncio Apostólico em Portugal e a todos os bispos portugueses, defende que este fundo deve ser criado “com as receitas da Renúncia Quaresmal de todas as dioceses do país e que seja anualmente reforçado através de um Ofertório Nacional promovido pela Igreja Católica em todas as celebrações dominicais, num domingo da Quaresma, uma vez que este é o tempo por excelência de penitência, expiação e reparação pelos pecados individuais e coletivos”.
O texto da petição – que até ao início da tarde foi subscrita apenas por 22 pessoas – considera que a posição pública assumida pela Igreja na passada sexta-feira, após análise do relatório da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Menores na Igreja, só pode merecer o “repúdio” dos que esperavam “uma atitude de aceitação e reconhecimento da responsabilidade própria da hierarquia católica sobre quaisquer crimes ocorridos”.
“A hierarquia católica em Portugal tomou uma direção diferente e, ao arrepio do que tem sido o apelo do Papa Francisco, pretende manter um véu de ocultação sobre os crimes cometidos no passado, mais remoto ou mais recente, refugiando-se em questões jurídicas e em formalismos legais”, acrescenta a petição.
Os subscritores pedem que a Igreja “não se fique apenas pelas palavras de pedido de desculpas ou por gestos de suposta homenagem como a construção de um monumento de homenagem às vítimas. Porque isso não é suficiente”.
Defendem, também, que o fundo, a ser criado, “deve ser gerido de forma independente por uma Comissão Nacional a constituir pela Conferência Episcopal Portuguesa e servirá tanto para financiar uma bolsa de profissionais (terapeutas, juristas, apoio psicossocial) disponíveis para apoiar as vítimas e familiares, como para compensar financeiramente as mesmas vítimas por atos comprovados de abusos sexuais cometidos, nomeadamente, por padres, religiosos e/ou outros educadores que atuem em nome da Igreja Católica em Portugal”.
Em declarações por escrito à agência Lusa, Nelson Araújo referiu que a iniciativa “é um gesto de indignação enquanto cidadão e enquanto católico pela não reação da Igreja Católica às conclusões da Comissão Independente que avaliou a questão dos abusos sexuais de menores praticados dentro da própria Igreja”.
“A Igreja enquanto instituição e comunidade pode não ter uma responsabilidade legal perante as vítimas, mas tem uma responsabilidade moral. E é em nome dessa responsabilidade moral que peço à Conferência Episcopal Portuguesa que crie este fundo de apoio às vítimas, considerando até que muitos dos crimes cometidos até já prescreveram e não haverá outra forma de compensação ou de justiça para as vítimas”, acrescentou o ex-sacerdote.
Segundo Nelson Araújo, se os bispos “se dispusessem a ouvir as comunidades cristãs que lideram, seguramente receberiam uma resposta amplamente favorável a este tipo de medida [criação do fundo], porque os cristãos católicos conhecem o valor da solidariedade e da compaixão com quem sofre. Infelizmente, os senhores bispos apenas estão preocupados em ‘lavar a cara e as mãos’ como Pilatos”.
Para o primeiro subscritor da petição intitulada Apoio às Vítimas de Abusos Sexuais na Igreja Católica Portuguesa, “convém não esquecer que estes crimes foram cometidos dentro da Igreja (fisicamente muitos deles, inclusive) e que os padres atuavam em nome da Igreja e usaram essa condição para alcançar os seus propósitos”.