PPD, PSD e Regionalização. Uma relação complicada em oito atos

PPD, PSD e Regionalização. Uma relação complicada em oito atos
| Política
Porto Canal

Da "democracia regional", expressão cunhada por Sá Carneiro, à feroz oposição à Regionalização, assumida por figuras como Cavaco Silva - já foram muitas as posições oficiais do Partido Social Democrata (ex-PPD) desde a sua fundação em relação ao tema. No 40.º Congresso, no Porto, abriu-se um novo capítulo: depois de Rui Rio ter assumido o compromisso de apoiar a realização de um Referendo em 2024, o novo líder, Luís Montenegro, tornou pública a sua oposição. A relação do PPD/PSD com a Regionalização é... complicada.

 

Luís Montenegro defende que esta não é a altura adequada para avançar com um referendo à regionalização, devido à situação internacional e nacional. No 40º Congresso Nacional do partido, o novo líder do PSD explicou que “fazer um referendo neste quadro crítico e delicado seria uma irresponsabilidade, uma precipitação e um erro”.

Assim, se o Governo avançar com este tema “não vai ter cobertura e aval do PSD”, afirma Luís Montenegro. O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, já reagiu e afirmou que "isso pode querer dizer que, de facto, se tem de apostar mais na descentralização, uma vez que é muito difícil, com o principal líder da oposição a opor-se à regionalização, haver no futuro próximo regionalização." Já Carlos César, Presidente do Partido Socialista, assegurou que "se o PSD se constituir como um travão a essas e outras reformas, isso não impedirá que façamos a nossa progressão e que concretizemos essas reformas."

Dentro do partido nem todos concordam com a posição, mas todos querem dar o benefício da dúvida ao novo líder. Mas afinal qual é a posição dos militantes sociais democratas sobre a regionalização? O partido foi sempre um dificultador do processo? Na verdade, não. E o passado mostra isso mesmo.

1976

Depois de um longo período de ditadura e com a democracia a começar a acordar em Portugal, em 1976 o país preparava-se para votar a Constituição. O documento previa a Regionalização e o PSD votou a favor, deixando um primeiro sinal de que o partido estava ao lado da autonomia regional.

1980

A chefiar o Governo estava Francisco Sá Carneiro que falava na importância de uma “democracia regional”. O fundador do PSD mostrava-se assim um apoiante claro da Regionalização. Do outro lado estava Mário Soares que, em oposição, nunca foi entusiasta da ideia.

1991

O Governo da Aliança Democrática, chefiado pelo social-democrata Aníbal Cavaco Silva, aprovava a Lei-Quadro das Regiões Administrativas. O PSD dava assim o primeiro grande passo no caminho da Regionalização.

1997

Na revisão constitucional apresentada pelo PSD, Marcelo Rebelo de Sousa, à data líder do partido e um opositor declarado à Regionalização, impunha a obrigatoriedade de um referendo sobre o tema. Nessa altura o Governo era chefiado por António Guterres, que em contrapartida se assumia como um apoiante da autonomia regional. A revisão constitucional do PSD acabou mesmo por ser aprovada. Instalava-se assim um verdadeiro “novelo constitucional da Regionalização”, tal como descreveu o constitucionalista Cândido Oliveira.

1998

Chegava o tão esperado referendo. E sem grandes surpresas o PSD posicionava-se contra. A campanha pelo não dos sociais-democratas acabou por funcionar e o referendo foi chumbado.

Com o chumbo do referendo de 1998, o assunto da Regionalização ficou na gaveta por 25 anos.

2016

A Regionalização estava adormecida, mas o país preparava-se para receber um novo presidente. Marcelo Rebelo de Sousa, que já se tinha mostrado como um opositor forte da ideia, assumia o lugar de Chefe de Estado.

2021

Marcelo Rebelo de Sousa trazia a Regionalização de volta ao debate político ao mencionar o tema no discurso que fez no congresso da Associação Nacional de Municípios.

No mesmo ano, António Costa e Rui Rio firmavam um compromisso para um referendo em 2024 e para uma possível revisão constitucional para alterar as regras da auscultação da população. 

2022

Na campanha para as eleições legislativas antecipadas, o PS assumia o compromisso no programa eleitoral de agendar um referendo à Regionalização em 2024. Ao mesmo tempo, Rui Rio, líder do PSD, confirmava uma mudança de direção na posição do partido. Apesar de não assumir a Regionalização como tema prioritário no manifesto eleitoral, Rio pronunciava-se favoravelmente à hipótese de um referendo e assumia publicamente o compromisso da data avançada pelos socialistas.

Já depois das eleições de 30 de janeiro, o partido apresentava um novo projeto de revisão constitucional, da autoria do até ao congresso líder da bancada parlamentar, Paulo Mota Pinto. O documento sugeria uma simplificação do referendo, ao eliminar a obrigatoriedade da participação da maioria do universo eleitoral e logo surgiu a oposição de nomes como Cavaco Silva. O antigo primeiro-ministro afirmou, em entrevista à CNN Portugal, que a Regionalização seria "um erro muito grande para o futuro do país", e avançou: "Eu votarei contra." Uma posição que mereceu reação imediata dos seus ex-ministros Miguel Cadilhe (Finanças) e Luís Valente de Oliveira (Planeamento e Administração do Território). Num artigo conjunto publicado no Jornal Público, Cadilhe e Valente de Oliveira dirigiram críticas contundentes e inéditas ao ex-líder do PSD.

 A questão é que a revisão era apresentada ao mesmo tempo que o Rui Rio pedia a demissão, na sequência dos maus resultados das eleições legislativas. O então presidente do PSD deixava assim uma certeza: se um dos dois candidatos às eleições diretas não concordasse com a iniciativa, a proposta de revisão seria retirada, tal como acabou por acontecer. Na campanha para as diretas, Luís Montenegro dizia que a discussão da regionalização “era extemporânea”, uma posição que se mostrava como um prelúdio da decisão que apresenta agora no congresso que o consagra como o novo líder do PSD.

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