O que se sabe sobre as novas variantes do Covid-19 e em que ponto estamos na luta contra a pandemia?

O que se sabe sobre as novas variantes do Covid-19 e em que ponto estamos na luta contra a pandemia?
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Porto Canal com Lusa

Após as primeiras vagas da covid-19, autoridades de saúde, governos e cientistas viram agora as suas atenções para as variantes do vírus SARS-CoV-2, consideradas uma nova “ameaça” ao ambicionado regresso à normalidade.

A Comissão Europeia já propôs um novo plano de preparação de biodefesa contra a covid-19 destinado a “preparar a Europa para a crescente ameaça das variantes” do coronavírus, duas das quais já detetadas em Portugal.

O Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA) estima que a variante detetada no Reino Unido represente cerca de 48% de todos os casos covid-19 em Portugal, quando na primeira semana de janeiro foi responsável por apenas 8% dos casos da doença registados.

Relativamente à variante originária da África do Sul, o INSA apenas identificou quatro casos em Portugal, não tendo sido registado, até quinta-feira, qualquer caso da variante do SARS-CoV-2 descoberta inicialmente em Manaus, no Brasil.

O surgimento de novas variantes do vírus, que os especialistas admitem ter uma maior capacidade de transmissão, tem levantado questões como a eficácia das vacinas já existentes e a possibilidade de gerarem casos mais graves da doença, novas “ameaças” que têm centrado a atenção dos especialistas.

 

Como surgem as variantes de um vírus

Quando um vírus faz cópias de si mesmo, essas alterações são consideradas mutações. Um vírus com uma ou várias novas mutações é considerado como uma variante do original.

Algumas mutações podem levar a alterações nas características de um vírus, como a sua maior ou menor capacidade de transmissão e o nível ou gravidade de uma doença que pode provocar.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o SARS-CoV-2, que causa a covid-19, tende a alterar-se mais lentamente do que outros vírus já conhecidos, como o Influenza que causa a gripe.

Até agora, centenas de variações do SARS-CoV-2 foram identificadas em várias partes do mundo, com a grande maioria a ter um reduzido impacto nas propriedades do coronavírus original.

 

Concertação mundial para compreender as variantes do SARS-CoV-2

Desde o início da pandemia, a Organização Mundial de Saúde (OMS) está a trabalhar com uma rede global de laboratórios especializados em investigação e na realização de testes para melhor compreender o comportamento do SARS-CoV-2.

Estes grupos de pesquisa sequenciam o SARS-CoV-2 e compartilham os resultados em bancos de dados públicos, incluindo o GISAID, uma organização de pesquisa reconhecida pela Comissão Europeia e parceira do PREDEMICS, um projeto sobre a previsão e prevenção de vírus zoonóticos (com capacidade de serem transmitidos por animais aos humanos) com potencial pandémico.

Esta colaboração global permite aos cientistas de várias partes do mundo rastrear o vírus e as suas mutações de forma mais eficaz e rápida.

A rede global de laboratórios da OMS inclui ainda um grupo de trabalho sobre a evolução do SARS-CoV-2 dedicado especificamente a detetar novas mutações e a avaliar o seu previsível impacto.

A OMS tem reiterado a recomendação para que todos os países aumentem o esforço de sequenciamento do vírus e que compartilhem estes dados internacionalmente, num esforço global de monitorização e resposta à evolução da pandemia.

 

Como é feito este acompanhamento em Portugal

O Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA) é a entidade coordenadora nacional da vigilância laboratorial genética e antigénica do vírus SARS-CoV-2.

Esta vigilância laboratorial compreende a deteção, caracterização genética e antigénica do vírus em território nacional e é desenvolvida com base em redes sentinela (cuidados de saúde primários e hospitais), complementada com outras redes laboratoriais.

A sequenciação do genoma de vírus SARS-CoV-2 permite entender o percurso da transmissão e o tempo em que as diversas variantes genéticas do vírus estão presentes em determinada região ou país.

Ao desvendar o percurso do coronavírus, as autoridades de saúde pública, profissionais de saúde e investigadores podem adotar as medidas adequadas para tentar conter a sua disseminação e apoiar o desenvolvimento de estratégias de prevenção e de combate contra a covid-19.

A rede de laboratórios nacional deve, obrigatoriamente, proceder ao envio periódico para o INSA de amostras positivas de SARS-CoV-2. Na seleção de amostras para a vigilância laboratorial é privilegiada a representatividade geográfica, cobertura de todas as faixas etárias, apresentação de doença ligeira a grave e surtos locais.

 

A ameaça das variantes na retoma europeia

O Banco Central Europeu (BCE) considera que as novas estirpes do novo coronavírus representam um risco para a recuperação da economia da Zona Euro.

Na ata da reunião de política monetária de janeiro, publicada recentemente, o BCE nota que "persiste uma grande incerteza, especialmente no que respeita à dinâmica da pandemia e à implementação atempada das campanhas de vacinação".

 

Nova estratégia europeia para enfrentar uma nova ameaça

A Comissão Europeia já propôs um novo plano de preparação de biodefesa contra a covid-19, face à ameaça das variantes do coronavírus, assente numa melhor deteção das estirpes, maior rapidez na aprovação de vacinas e aumento da sua produção.

Denominada “Incubadora HERA” – a sigla da futura Autoridade Europeia de Preparação e Resposta a Emergências de Saúde -, a nova estratégia é justificada pelo executivo comunitário com a necessidade de “preparar a Europa para a crescente ameaça das variantes” do coronavírus.

De acordo com o Centro Europeu de Controlo e Prevenção de Doenças (ECDC), a variante B.1.1.7, reportada pela primeira vez na Grã-Bretanha, parece estar em vias de se tornar dominante sobre as estirpes anteriores na UE, aponta a Comissão, advertindo que “outras estirpes e mutações poderão emergir no futuro”.

Para preparar a Europa para este cenário, a Comissão Europeia propõe então uma estratégia que envolve investigadores, empresas biotecnológicas, fabricantes, reguladores e autoridades públicas, para monitorizar variantes, trocar dados e cooperar na adaptação de vacinas.

De acordo com Bruxelas, o plano irá focar-se em três grandes pilares: a deteção, análise e adaptação a variantes de vírus; aceleração da aprovação de vacinas adaptadas às novas estirpes e um aumento da produção em massa de vacinas contra a covid-19, novas ou adaptadas.

 

Autoridades de saúde britânicas investigam nova variante

As autoridades de Saúde britânicas identificaram uma nova variante em Inglaterra do coronavírus da covid-19, que designaram por B1525, com a mesma mutação E484K encontrada noutras variantes mais infecciosas, revelou quarta-feira a direção-geral de Saúde inglesa.

Além da variante B117, que já se alastrou a dezenas de países incluindo Portugal, e da nova B1525, as autoridades de saúde estão a investigar mais duas variantes primeiro identificadas em Inglaterra por também apresentarem a mutação E484K, que é comum noutras variantes detetadas no Brasil e África do Sul.

O Reino Unido tem estado a sequenciar o genoma do vírus de milhares de testes para tentar encontrar mutações e potenciais novas variantes para potencialmente ajudar os cientistas a desenvolver novas vacinas mais eficazes.

 

ECDC: Variantes são motivo de preocupação na Europa

O Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças (ECDC) considera, no relatório de avaliação de risco, que os países da União Europeia (UE) e do Espaço Económico Europeu (EEE) têm “observado um aumento substancial no número e proporção de casos” da mutação detetada no Reino Unido, tendo ainda “notificado cada vez mais” casos da estirpe da África do Sul.

Já a variante identificada no Brasil “está a ser notificada a níveis mais baixos, possivelmente porque está principalmente ligada ao intercâmbio de viagens com o Brasil”, observa o organismo, numa alusão à interrupção de viagens decretada por alguns países europeus.

Segundo o ECDC, a variante originária do Reino Unido tem de momento um risco “elevado a muito elevado para a população em geral e muito elevado para indivíduos vulneráveis”, isto porque “parece ser mais transmissível do que as estirpes em circulação anteriormente predominantes e pode causar infeções mais graves”.

Por seu lado, a mutação detetada na África do Sul “está também associada a uma maior transmissibilidade” e poderá levar a uma “potencial de redução da eficácia de algumas das vacinas” já aprovadas contra a covid-19.

Dada esta situação, e com o aumento da circulação destas variantes mais transmissíveis, o ECDC aconselha os Estados-membros (já que a saúde é uma competência nacional) a apostar em “intervenções de saúde pública imediatas, fortes e decisivas são essenciais para controlar a transmissão e salvaguardar a capacidade de cuidados de saúde”.

“A menos que as intervenções não-farmacêuticas [medidas restritivas] se mantenham ou sejam reforçadas em termos de conformidade durante os próximos meses, é de prever um aumento significativo dos casos e mortes relacionados com a covid-19 na UE/EEE”, avisa o centro europeu.

 

Capacidade de sequenciação na UE abaixo do definido

Na maioria dos Estados-Membros, a capacidade de sequenciação para identificação de variantes do SARS-CoV-2 está abaixo da recomendação definida pela Comissão Europeia para sequenciar 5%-10% das amostras positivas para SARS-CoV-2, alerta o ECDC.

Embora a maioria dos países da UE / EEE esteja investigando ativamente o surgimento de variantes da SARS-CoV-2, três países não o estão fazendo.

Muitos países estão a aumentar ou a planear aumentar a sua capacidade de sequenciação, mas indicaram a necessidade de apoio do ECDC.

As necessidades específicas incluem suporte com capacidades de sequenciamento e protocolos e com bioinformática em particular.

Para muitos países, o tempo de resposta para os resultados da pré-triagem PCR compartilhados com as autoridades de saúde pública é superior a 48 horas.

 

A resposta das vacinas contra as variantes

A UE pretende acelerar os procedimentos de autorização de vacinas melhoradas para responder às diferentes variantes do novo coronavírus, indicou recentemente a comissária da Saúde dos 27.

“Analisamos com a Agência Europeia do Medicamento os procedimentos e decidimos que, doravante, se houver uma vacina melhorada por um fabricante para lutar contras as novas variantes com base numa vacina já existente” e certificada “não haverá a necessidade de passar por todas as etapas da autorização”, disse a comissária Stella Kyriakides.

A Comissão Europeia tem sido criticada pela lentidão ligada ao início das campanhas de vacinação contra a covid-19 nos Estados membros, por causa dos procedimentos de certificação das primeiras vacinas, considerados muito longos em comparação com o Reino Unido ou com os Estados Unidos, mas também no que diz respeito aos pedidos de vacinas.

 

Um vírus que compete com ele próprio

O vírus que provoca a covid-19 está a “competir com ele próprio neste momento”, gerando novas variantes que vão predominar em qualquer parte do mundo em função da eficácia de disseminação que apresentarem, afirmou o virologista Pedro Simas.

Segundo o especialista do Instituto de Medicina Molecular de Lisboa, enquanto o SARS-CoV-2 apresentar características pandémicas, ou seja, provocar um elevado e generalizado número de infeções diárias, as variantes que surgirem com uma maior capacidade de disseminação “vão-se espalhar por todo o mundo” e não apenas numa determinada área geográfica.

“As variantes que forem mais eficientes a disseminar serão as que vão predominar em qualquer parte do mundo. Há tantas infeções nos vários continentes que as mutações aparecem de forma aleatória. Como há tanta infeção, há uma grande possibilidade dessas mutações aparecerem”, explicou Pedro Simas.

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