Grécia: Governo vai respeitar vontade popular no referendo
Porto Canal / Agências
"Se os gregos votarem "sim" no referendo, mesmo que seja por medo, respeitaremos a sua decisão. Somos um Governo democrático e vamos respeitar a decisão popular. Mas não será o nosso Governo a assinar um acordo que não aceitamos", disse, em declarações à Lusa, Theodoros Dritsas, 68 anos, um dos fundadores do Syriza em 2004, eleito deputado pelo partido desde 2007 e atual ministro-adjunto para os Assuntos Marítimos.
"Existe a Constituição, existem instituições, e respeitaremos o que a Constituição prevê", garantiu ainda o membro do Governo, numa das diversas salas no longo corredor do segundo andar do parlamento, onde se instalou o seu grupo parlamentar, com 149 dos 300 deputados.
No próximo domingo, os gregos são chamados às urnas para se pronunciarem em referendo sobre os termos do acordo proposto pelos credores internacionais, após cinco meses de negociações inclusivas.
O Governo dominado pelo partido da esquerda radical Syriza apelou ao voto no "não" e garantiu o apoio dos seus parceiros de coligação dos Gregos Independentes (direita nacionalista), e dos neonazis do Aurora Dourada, que na madrugada de domingo também legitimaram a consulta no parlamento após 15 horas de debates.
A oposição de centro e de direita (ND, Pasok e To Potami), já apelou ao "sim" e convocou para o final da tarde de hoje uma concentração em Atenas. Já o Partido Comunista (KKE) acabou por votar no parlamento contra a realização do referendo e deverá apelar à abstenção.
"Estamos convencidos que o "não" vai vencer no referendo, mas se o povo decidir o contrário, saberemos o que temos de fazer", sublinhou o ministro-adjunto, ao considerar que o Syriza não poderá continuar a governar sem o apoio da população.
"Os nossos adversários dizem que a esquerda não é democrática, mas não podemos ser governo sem o poder do povo. O nosso Governo é verdadeiramente de esquerda e apenas estamos determinados em ser um Governo do povo", assegurou.
De acordo com a Constituição helénica, a rejeição de um referendo apresentado pelo Governo não implica necessariamente a queda do executivo, e para ser legitimado necessita de uma participação mínima de 40% mais um dos eleitores inscritos.
No entanto, Theodoros Dritsas garantiu que as "portas para as conversações" com os credores e parceiros europeus "estão abertas" em permanência. "É o que estamos a tentar fazer, mas Bruxelas não provou que pretende o mesmo".
O ministro-adjunto recordou a posição reassumida na segunda-feira pelo primeiro-ministro Alexis Tsipras, que em entrevista à televisão pública ERT considerou o referendo uma forma para negociar em melhor posição.
O fundador e dirigente do Syriza sublinhou que novos recuos de Atenas nas negociações seriam entendidos com "uma humilhação, não para o Governo grego, mas para o povo grego", e sugeriu que a outra parte deveria emitir novos sinais para um compromisso.
"Bruxelas também pode recuar porque têm nas suas mãos o futuro da Europa, caso queiram ser o futuro da Europa. Se o decidirem, podem efetuar alguns passos atrás, não porque a Grécia o pretende, mas por deterem o futuro da Europa. E se a Europa quer futuro, também devem decidir recuar. Ninguém pretende um desastre, ninguém quer uma rutura", disse.
O ministro-adjunto considerou, no entanto, que as prologadas discussões entre Atenas e os credores internacionais, e a liderança da União Europeia, permitiram iniciar uma discussão decisiva sobre "que género de Europa" se pretende, um tema que tinha acabado de abordar num discurso parlamentar.
"Durante estes cinco meses de negociações, a Europa teve de enfrentar este género de problemas, não estou seguro quando vão acontecer essas mudanças e qual a sua amplitude, mas sabemos que a discussão está instalada", disse.
Apesar de não defender uma "continuidade genética entre os gregos modernos e gregos antigos", Theodoros Dritsas recordou que no seu país existe uma "noção muito apurada" da tragédia grega da Antiguidade clássica.
E deixou uma certeza: "Talvez não consigamos vencer agora, mas tenho a certeza que as coisas acabarão por mudar. O tempo é um fator político muito importante".
PCR // VM
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