Nas Ilhas da Lomba, Bonfim, (re)constrói-se dignidade

Nas Ilhas da Lomba, Bonfim, (re)constrói-se dignidade
Foto: Porto Vivo, SRU – Sociedade de Reabilitação Urbana do Porto, E.M., S.A.
| Porto
Ana Francisca Gomes

Na Lomba, Bonfim, seis ilhas esperam pelas obras de reabilitação anunciadas pela Câmara do Porto em 2021. A autarquia liderada por Rui Moreira já adquiriu a totalidade das casas e os trabalhos deverão começar em março, mas 21 famílias continuam por realojar.

Já nada falta ao município do Porto para avançar com a reabilitação de seis ilhas outrora privadas na zona da Lomba, freguesia do Bonfim, garantiu o vereador Pedro Baganha em entrevista ao Porto Canal.

O processo de aquisição das casas, que foi concluído “há dois ou três meses”, arrastou-se no tempo com os entraves esperados numa zona da cidade marcada pela profusão de ilhas. Em seis casos, foi necessário recorrer à expropriação, por serem desconhecidos os proprietários ou por falta de acordo.

Este capítulo já está, contudo, encerrado. “Portanto, neste momento, não há qualquer obstáculo ao avanço das obras que acontecerá até ao final deste trimestre”, garantiu o vereador que acumula os pelouros da Habitação, Urbanismo e Espaço Público. A autarquia mantém o mês de março na mira para dar início aos trabalhos, mas uma visita ao local permite perceber que continuam por realojar habitantes.

 Porto Canal

Foto: Ana Francisca Gomes | Porto Canal

“Ainda estamos por aqui umas 20 pessoas. Pelo menos”, explica Luís, um dos moradores a quem a habitação foi expropriada por falta de acordo no valor monetário da venda. O sexagenário já tem uma nova casa: vai morar para uma rua entre a Ribeira e a Sé, mas as mudanças ainda não passam de um vislumbre. “Já tenho destino, só que onde anda a carta a formalizar a saída? Enquanto não me enviarem, eu não começo a arrumar as minhas coisas”.

A ‘boa-nova’ de já haver data para o início do processo é trazida pelo Porto Canal a uns vizinhos que falavam à porta. “Não sabia que estava para acontecer já, há tanto tempo que se fala disto …”, atira um morador, que fica de pé atrás com a brevidade do calendário: “Como é que vão realojar tão rápido tanta gente?”.

“Quer ver a minha casa e explicar-me como é que em apenas um mês eu consigo desmontar tudo o que tenho e fazer as mudanças?”, acrescenta Luís em concordância, já com a chave na fechadura.

Segundo dados disponibilizados pela autarquia, a 22 de fevereiro apenas tinham sido realojadas 19 das 40 famílias, num processo que deverá estar concluído até 15 de março.

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Foto: Ana Francisca Gomes | Porto Canal

Um Investimento de 7,7 milhões

A vontade de dar uma solução digna a estes agregados foi expressa pelo executivo já no final do ano de 2021, mas só começou a materializar-se a 18 de novembro de 2022, com a assinatura de um protocolo entre a Porto Vivo, SRU e o Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU).

“Esta é a primeira vez em 150 anos em que não se fala em erradicar ilhas, mas sim em reabilitar”, destaca o vereador, que acredita que as políticas de urbanismo e investimento público não devem olhar para as ilhas “como um problema”, mas apenas como uma condição. “Porque um problema é qualquer coisa que eu resolvo e uma condição é qualquer coisa com a qual eu vivo”.

No quarteirão que faz frente à rua de Pinto Bessa, compreendido entre a rua de Vera Cruz, rua do Lourenço e Travessa da Lomba, são 65 as casas que vão ser demolidas. O acordo, contudo, pressupõe a reabilitação de apenas 47 habitações, um número que corresponde à quantidade dos agregados familiares pré-existentes. A ideia é devolver, em 2026, as casas aos moradores originais.

“As construções que lá existiam não tinham qualidade nem valor arquitectónico suficiente para serem mantidas. São habitações muito precárias, sem quaisquer condições de habitabilidade”, contextualizou o autarca.

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Foto: FUSÃO ©️ 2021 — all rights reserved

E como é que se intervém garantido que é salvaguardado o sentido de comunidade e os laços existentes? “As pessoas têm que ser as mesmas”, acredita, “convictamente”, Baganha.

“A reabilitação urbana não é apenas física, tem também uma componente imaterial. E é nesse sentido que vamos aproveitar estas casas para manter as pessoas que lá viviam. Isto também é reabilitar a cidade. A reabilitação não é só física, é imaterial. A manutenção destes moradores nestes territórios é um dos objectivos desta política”.

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Vista geral

‘Há respeito pelas pessoas e pelas memórias delas’

O projeto de reabilitação é assinado por Maria Souto Moura, Francisco Pina Cabral, Francisco Amoedo Pinto e Luís Vitorino Caleiro e prevê que o novo complexo disponha de 34 habitações de tipologia T1, 10 de tipologia T2 e três de tipologia T3.

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Esquina entre Rua do Lourenço e Travessa da Lomba. Foto: FUSÃO ©️ 2021 — all rights reserved

“A própria ilha, em termos de habitação, não é uma coisa salubre, nem uma situação ideal. E as pessoas que vivem lá têm consciência disso”, começa por desmistificar o arquiteto Francisco Pina Cabral, para quem não se pode manter intacto uma estrutura que “já tem muitos defeitos por princípio”.

Mas, quando se intervém num espaço, a ordem de prioridades inverte-se. “Falo apenas da construção, não falo do sentido de comunidade. Isso é algo que queremos e tentamos preservar ao máximo”, acrescenta o arquiteto, que exemplifica a intenção com a previsão de criar espaços comuns.

“Considero que há respeito por estas pessoas e pelas suas memórias. Não estamos a tentar apagar nada, estamos apenas a dar ideias daquilo que é digno dessas mesmas pessoas. Não são só as pessoas ricas que têm direito a uma casa digna”.

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Um pátio no interior das ilhas. Foto: FUSÃO ©️ 2021 — all rights reserved

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