Falta de passeios, inexistência de passadeiras e velocidade excessiva. O retrato da Circunvalação do Porto
Catarina Cunha
Ao longo dos anos, sobretudo no interior das grandes cidades, o carro tornou-se um meio de transporte indispensável na vida das pessoas. Nos dias de hoje, há um crescente detrimento pelo transporte público e até já há quem prefira ‘galgar’ a calçada na hora de ir de casa ao trabalho, ou vice-versa.
Mas, afinal, como é andar a pé pela Circunvalação, no Porto? Estão reunidas todas as condições de segurança? É fácil largar o carro nesta via? O Porto Canal foi tentar responder a estas questões.
São 9 horas da manhã de segunda-feira e a chuva cai na cidade do Porto.
O trânsito está em pára-arranca; os peões estão a circular na estreita berma da estrada contíguos às filas de trânsito; há pessoas a atravessarem a rua a correr; e as paragens de autocarro junto à rodovia estão repletas de passageiros que se resguardam como podem, face ao ‘manto’ de água que lhes é atirado para as pernas aquando a rápida passagem dos automóveis.
Em poucos segundos, fizemos uma ‘radiografia’ à mobilidade daquela via rodoviária e fomos falar com os principais lesados. Debaixo de uma das paragens de autocarro da zona da Senhora da Hora, em Matosinhos, conversamos com Hélder Cervantes, morador numa das transversais da Circunvalação há sensivelmente cinco anos.
“Os peões não são bem-vindos, isto é uma via desenhada para carros, é uma mistura entre avenida e via rápida”, começou por criticar.
O habitante explica que a Circunvalação não tem passeios, não possui uma via para o transporte público, nem uma ciclovia e também há falta de pontos de atravessamento, levando os peões a circular na berma, onde, muitas vezes, estão carros estacionados irregularmente.
A opinião é partilhada pela generalidade de peões com quem falámos, como o Ricardo que antes de dar o seu testemunho sentiu na pele o que é ser um peão na Circunvalação, pois esperou alguns minutos à chuva para conseguir atravessar a rua.
Mal viu uma ‘brecha’, atravessou, arriscando-se “a apanhar com o carro em cima” e dirigiu-se à paragem de autocarro. Foi lá que o interrompemos, enquanto esperava pelo 205.
“Quando chove e temos as bordas do passeio alagadas, qualquer pessoa que esteja próxima vai entrar no autocarro um tanto ou quanto molhada, talvez chegá-las um pouco mais para trás, ou resguardá-las não seria uma má ideia”, sugere.
A sensação de insegurança na Circunvalação abrange também os ciclistas.
Circunvalação com perfil de autoestrada
Deixamos o Ricardo seguir viagem e começamos a dar ‘duas de letra’ com Maria Alves, que com um olho para a câmera e outro para a estrada, de modo a ver quando é que o seu autocarro chegava, confirmou que “é muito complicado andar a pé” na Circunvalação “porque não há passeios”.
A moradora que reside naquela zona há cerca de 35 anos afirmou também ser “perigoso” atravessar a estrada devido à velocidade dos veículos e ao elevado tráfego automóvel.
Recorde-se que a Circunvalação está sujeita a uma velocidade controlada de 50 Km/h, mas segundo os peões o limite é ultrapassado, constantemente.
“Às vezes ando de carro e tento ir a 50km/h e passa um carro por mim que tem que ir pelo menos a 70 km/h porque vai a muita velocidade”, confessou Maria Alves.
Para fazer jus à velocidade, a rodovia é sujeita a operações de controlo de velocidade por radar fixo, ações que são levadas a cabo pela PSP.
Para Hélder Cervantes, deveriam existir “operações de controlo de velocidade” durante a noite.
“Quem mora nesta zona ouve quase todas as noites carros de alta cilindrada a fazer disto um autódromo e é curioso ver que a Polícia age numa altura em que as pessoas estão a fazer a sua vida e estão a levar os filhos à escola, mas quando há comportamentos de falta de civismo não vemos presença policial”, interroga-se o residente.
Requalificação da Circunvalação não avançou
A Circunvalação foi construída no século XX e liga Matosinhos à Ribeira do Porto, tendo 17.000 metros de comprimento. Decorria o ano de 2017 quando foi apresentado um projeto de requalificação para a rodovia.
O investimento na ordem dos 58 milhões de euros previa renovar 17 quilómetros da via nos municípios do Porto, Matosinhos, Gondomar e Maia, sendo que a transformação do separador central como um corredor que seria destinado ao transporte público e a uma ciclovia.
O projeto que tornava a Circunvalação numa Alameda urbana com velocidade reduzida ‘caiu por terra’ por falta de financiamento.
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