“Já foi rico, agora é pobre”. São João das Fontainhas perde tradição
Ana Mota
Dizem que já não é o que era. Quem vive nas Fontainhas, uma das zonas mais antigas e típicas da cidade do Porto, recorda uma festa “sem igual” que “perdeu muita gente” nos últimos anos. No Bairro dos Moinhos este pode mesmo ser o último São João a ser celebrado pelos moradores.
Os preparativos começaram com mais de uma semana de antecedência. A Rua Gomes Freire, nas Fontainhas, já está apetrechada de martelos e luzes de São João que se conseguem ver pela janela da mercearia do Sr. Luís. “Repare que até a iluminação é pobre, nem se nota, só durante a noite”, explica o proprietário da Pérola das Fontainhas. À poupança na eletricidade, soma-se a vista pouco ou nada desafogada para o fogo de artificio e a falta de comerciantes na rua. “Enquanto não houve mais São João pela cidade era tudo para as Fontainhas. Na hora do fogo nem se podia andar porque as pessoas paravam para o ver. Agora, como o fogo é proibido na Serra do Pilar, já não tem nada a ver”, conta. Os comerciantes, atraídos pelos preços mais baixos noutras zonas da cidade, também já não vendem nas Fontainhas.
“Antigamente vinham muitos barraqueiros, agora não. Está tudo muito diferente”. Fernanda Santos é das moradoras mais velhas das Fontainhas. Há 74 anos que vive na casa que a viu nascer. “Sempre gostei de viver aqui, a vista é maravilhosa. Não me dava noutro lado, daqui só para o cemitério”, conta. No que toca ao São João, recorda a altura em que toda a gente fazia negócio com a festa. “Antigamente vinha aqui muita gente, comerciantes e portuenses. Antigamente, na Praça da Alegria e na Alameda existiam muitas barracas com sardinhas e pão quente”, recorda.
Último São João no Bairro dos Moinhos
No Bairro dos Moinhos este ano a festa pode ser a última. A autarquia do Porto está em processo de negociação para a aquisição dos terrenos que foram assolados pelas cheias, em janeiro deste ano, e os moradores acreditam que podem sair no prazo de um ano “ Vamos chegar a uma altura em que nós vamos para os bairros e lá não há sitio para meter fitas. Se eles estão a dizer que daqui a uns meses a coisa está viável [a saída dos moradores do bairro], automaticamente vai deixar de existir São João. Não vamos levar isto para onde formos”, explica José Marques, morador no Bairro dos Moinhos há 79 anos.
Das 23 famílias que viviam no bairro, antes das cheias na cidade do Porto em janeiro deste ano, apenas restam cerca de 15 agregados familiares. Quanto ao futuro a dar aos terrenos, a autarquia diz apenas que serão feitos estudos à estabilidade dos terrenos sem nada acrescentar sobre o futuro dos moradores.
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