Para onde caminha o Morro da Sé? “Não se vê vizinhos, não se vai pedir sal ou azeite a um vizinho porque não há”
Pedro Benjamim
O Morro da Sé está a ser alvo de uma longa reabilitação, que conta com mais de dez anos. A mais recente iniciativa, “Operação D” previa disponibilizar 14 frações habitacionais no final de 2022, mas até ao momento só três foram entregues. O Porto Canal calcorreou várias veias do bairro que hoje em dia vive com turistas, toxicodependentes e residentes – poucos – de longa data.
Do alto da Sé do Porto vêem-se as cidades, parte do Porto e parte de Gaia, com o Douro, que nos últimos dias esteve adornado com navios da Marinha.
Começa-se a descer o Morro da Sé, em direção ao mercado de São Sebastião, que já estava fechado às primeiras horas da tarde. Quando está aberto é um mercado pouco habitado e pouco visitado. “Quem é que vai entrar num mercado daquela qualidade se à porta se drogam e se injetam com seringas?” pergunta Fernanda Silva, uma das moradoras de longa data do bairro.
A pergunta foi ouvida dentro da casa da ‘Nandinha’, como é conhecida. É uma das poucas moradoras que sempre viveu no bairro. Nasceu na travessa de Santana há 69 anos e da travessa mudou-se para a rua com o mesmo nome há 28.
Em conversa com o Porto Canal, Fernanda Silva atira: “não se vê vizinhos, não se vai pedir sal ou azeite a um vizinho porque não há”.
A moradora queixa-se da falta de vizinhos e, apesar de estar em curso a reabilitação do Morro da Sé, ‘Nandinha’ tem saudades de como se vivia. “Não se vê crianças a brincar na rua… jogava-se à sameirinha, jogava-se ao elástico, jogava-se à corda e agora não há nada”.
A 6 de abril, o Porto Canal noticiava que o Regulamento Municipal para o Crescimento Sustentável do Alojamento Local (AL), que tem em conta os fogos disponíveis para habitação permanente ou arrendamento de longa duração e os estabelecimentos disponíveis para AL, tinha um rácio na freguesia da Sé de 44,1%. No total foram contabilizadas 2660 unidades para moradores de longo prazo, contra 1173 alojamentos locais.
A requalificação do Morro da Sé
Em agosto de 2020 era anunciado o concurso para a “Operação D” da reabilitação do Morro da Sé. Quatro meses depois, em dezembro do mesmo ano, as obras já estavam a decorrer, num concurso vencido pelo empreiteiro RBT- Construções S.A. No verão desse ano apontava-se a conclusão da obra no prazo de dois anos, ou seja, no final de 2022.
A “Operação D”, uma das várias iniciativas de reabilitação do morro, prevê a disponibilização de 14 frações habitacionais para integrar o programa municipal de arrendamento acessível, mas até ao momento não estão todas finalizadas.
Em resposta ao Porto Canal, a câmara do Porto refere que se encontram “concluídas três frações habitacionais”, acrescentando que “está prevista a conclusão de mais sete frações habitacionais em junho e em agosto das restantes quatro frações habitacionais”.
As três unidades que já estão terminadas “foram atribuídas em regime de arrendamento acessível”, refere a autarquia.
A par das frações habitacionais o projeto da “Operação D” prevê também a disponibilização de quatro frações com outros fins. Na resposta ao Porto Canal, a câmara do Porto frisa que está já “concluída uma fração de serviços” e “está prevista a conclusão em junho de duas frações comerciais e em agosto da última fração comercial”.
O comerciante da Rua dos Mercadores
“Carlos Meireles Ribeiro, mais conhecido por Meireles aqui na zona” era assim que se apresentava enquanto trabalhava num sofá que estava a restaurar. O estofador, que agora trabalha na rua dos Mercadores chegou ao bairro em setembro de 1978, estabelecendo-se na rua de Santana.
Anos mais tarde sairia de lá para se mudar para o prédio onde está agora, um pouco mais abaixo na geografia do morro.
Há mais de 40 anos a trabalhar no bairro aponta que “já foi uma grande situação de droga, e agora – como diz o outro – está limpo, mas custou muito tempo, passaram muitos anos para se fazer isto”, refere ao Porto Canal.
Passado esse problema na zona onde se encontra, Meireles aponta agora apenas um problema no seu dia a dia: “O único problema de trabalhar são as cargas e descargas”.
Nova residência universitária atrasada
Em março de 2022 a autarquia e a Federação Académica do Porto (FAP) assinaram um protocolo para a instalação de uma residência universitária na Rua da Bainharia, no antigo Centro Social da Sé. A abertura estava prevista para o início do ano letivo do mesmo ano, naquele que é um projeto piloto de gestão partilhada de residências universitárias.
Tal não viria a acontecer, já que foram encontrados problemas durante a intervenção que estava a ser feita para preparar a infraestrutura, apontava a vereadora da Educação em reunião do executivo em abril deste ano.
"Foram encontradas no edifício patologias à medida que a intervenção foi feita. O edifício carecia de intervenções, sob o ponto de vista de segurança", afirmava Catarina Araújo.
Em resposta ao Porto Canal, a autarquia avança que “a conclusão da obra está prevista para meados de julho”, revelando a Federação Académica do Porto que "a residência estudantil estará pronta para o arranque do novo ano letivo 2023/24", que seguindo o calendário dos anos anteriores, deve acontecer a 1 de setembro.