Covid-19: Gratuitidade de bens culturais põe propriedade intelectual em perigo - ONU
Porto Canal com Lusa
Nações Unidas, Genebra, 28 abr 2020 (Lusa) - Os produtos culturais gratuitos - livros, filmes ou concertos - vulgarizaram-se durante a pandemia, com riscos para a propriedade intelectual, o que constitui uma situação de perigo para um setor já frágil, alertou hoje a agência da ONU.
A Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) lança o aviso quando entra em vigor um novo tratado internacional, concluído em 2012, que visa proteger os direitos dos trabalhadores do audiovisual e melhorar os seus rendimentos.
Os novos direitos permitem aumentar os pagamentos devido à retransmissão, numa altura em que muitas produções foram interrompidas no contexto do combate à pandemia da Covid-19.
"É difícil quantificar as consequências neste momento, mas o setor está em perigo", com muitas pessoas privadas de recursos, disse o diretor-geral da OMPI, Francis Gurry, à agência noticiosa France Presse, referindo que a produção de um filme, por exemplo, envolve centenas de pessoas.
"O momento não poderia ser melhor para aumentar a quantidade - e a previsibilidade - das receitas dos artistas audiovisuais, enquanto a pandemia do Covid-19 está a afetar a atividade económica" do setor, disse.
Apesar da adoção do novo tratado, o responsável da OMPI mostrou-se preocupado com a atual situação económica do setor da cultura.
Os governos devem preocupar-se com a saúde de seus cidadãos, disse Gurry, mas também devem apoiar o setor cultural, que é "fundamental para a saúde mental" das pessoas em situação de confinamento, afirmou.
Gurry está também preocupado com as muitas "exceções" à propriedade intelectual solicitadas durante a pandemia, "sem considerar os direitos autorais".
Os sistemas de propriedade intelectual fornecidos pela OMPI incluem exceções e limitações no setor de cultura e da criação, o que facilita o acesso a livros, publicações e outros conteúdos criativos em determinadas circunstâncias, e sob certas condições.
Durante a pandemia, museus, teatros de ópera e editoras disponibilizaram alguns de seus produtos gratuitamente, argumentando com a situação extraordinária de confinamento, mas Francis Gurry pediu cautela.
"Prescindir do direito autoral exige que seja demonstrado existir uma necessidade especial", afirmou, referindo que esta situação leva à redução das receitas no setor e, consequentemente, das receitas dos profissionais da cultura.
No presente caso, "não vejo necessariamente evidências de um problema de acesso ao conteúdo", concluiu o responsável da OMPI, para quem é sempre possível comprar bens culturais 'online', como livros ou música.
O Tratado de Pequim sobre 'performances' audiovisuais, que entra hoje em vigor, adapta a proteção dos profissionais do setor à era digital, enquadrado pela Convenção de Roma sobre a proteção dos artistas, de 1961.
Em consonância com outro tratado da OMPI, adotado em 1996 e dirigido às gravações áudio, o Tratado de Pequim concede direitos morais e económicos, inclusive para a divulgação 'online', a artistas audiovisuais.
"Em muitos países, não há proteção para os autores, [mas] se aderirem ao tratado serão forçados a estabelecer direitos para artistas audiovisuais", como atores de televisão e do cinema, explicou Gurry.
O Tratado concede aos artistas audiovisuais direitos económicos (calculado em valores monetários) sobre as suas interpretações, como o direito de reprodução (direito de autorizar a reprodução direta ou indireta da apresentação) e o direito de distribuição (direito de autorizar a colocação) ao público, de original e cópias da interpretação.
O documento também prevê que os artistas recebam direitos de transmissão e comunicação ao público das suas apresentações.
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