Brasil: Sistema eleitoral precisa de "ajustes indispensáveis"
Porto Canal com Lusa
Lisboa, 26 out (Lusa) -- O jurista brasileiro Ingo Wolfgang Sarlet afirmou hoje, em entrevista à Lusa, que os sistemas partidário, eleitoral e federativo do Brasil devem ser alvo de ajustes "indispensáveis", justificando que atualmente se elege "quem não se queria eleger".
Ingo Sarlet, que falava à Lusa, em Lisboa, à margem de um debate sobre os desafios político-constitucionais no Brasil, em que participou hoje, considerou que esta é uma posição cada vez mais defendida no país, alegando que o atual modelo favorece o populismo e elege representantes que, à partida, não seriam eleitos.
"Eu e muita gente entendemos, há muito tempo já, que alguns ajustes são indispensáveis, tanto no sistema partidário, quanto no sistema eleitoral, como no sistema federativo, para que se possa eventualmente conseguir, com uma nova perspetiva, um processo político democrático", disse Sarlet.
Para o jurista, os ajustes "são absolutamente necessários para que se possa ter maior equilíbrio do plano político eleitoral".
No Brasil, os eleitores votam através de um sistema proporcional com quociente eleitoral, o que leva a que um candidato possa "puxar" mais candidatos.
"Uma vez alcançado o quociente eleitoral, todos os votos que vão além do quociente eleitoral -- o mínimo para se eleger deputados federal ou estadual -- acabam puxando um outro candidato para a sigla partidária. E isso é apontado por muitos como uma deficiência porque elege quem não se queria eleger ou que não se elegeria sozinho, pelos seus votos", apontou Sarlet.
Questionado se estes mecanismos eleitorais favoreciam a existência de populismos, o jurista e professor de Direito assinalou que o Brasil vive numa "tradição" populista.
"O brasileiro não conseguiu se livrar de um populismo, quase um messianismo. É isso que se está percebendo agora. É um fenómeno que se pensava estar superado, mas que se manifesta novamente nesta eleição com toda a sua força", afirmou o jurista.
"Há uma tendência de se votar cada vez mais em pessoas que em programas partidários", disse Sarlet.
De acordo com o jurista, este fenómeno já deveria estar "superado", mas estas eleições contrariaram o esperado.
Ingo Sarlet acredita na possibilidade de alterações na Constituição do Brasil, mas sublinha que estas estão dependentes da composição final do Congresso, pós-eleições.
Sobre as eleições de domingo, o jurista acredita que o candidato Jair Bolsonaro deverá conquistar a vitória e considera é difícil que haja uma surpresa nos resultados.
"Embora a diferença percentual entre os candidatos tenha caído, ela ainda não é suficientemente próxima para que tenha um empate técnico. A não ser que haja uma reviravolta em termo de votos de indecisos, dificilmente o resultado será diferente da eleição do candidato Bolsonaro no segundo turno", afirmou.
Ainda assim, Ingo Sarlet vaticina que o "crescimento da radicalização" é "um fenómeno previsível" no Brasil, depois das eleições, independentemente do vencedor.
"A hostilidade entre os diversos grupos é algo que está a tomar uma dimensão surpreendente (...) no Brasil", admitiu.
A segunda volta das presidenciais brasileiras acontece no domingo, 28 de outubro, e será disputada entre e Jair Bolsonaro, candidato Partido Social Liberal (PSL, extrema-direita) e Fernando Haddad, candidato do Partido dos Trabalhadores (PT, esquerda).
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