Politóloga francesa fala em "sismo na vida política"
Porto Canal com Lusa
Paris, 24 abr (Lusa) - A politóloga Florence Faucher disse à Lusa que os resultados da primeira volta das eleições presidenciais francesas representam um "sismo na vida política" em França com "o fim dos grandes partidos" e a "rejeição do sistema político" atual.
"É realmente um sismo na vida política francesa que não é uma surpresa em si porque vimo-lo emergir e porque retoma muitas coisas que vemos noutros países europeus e nos Estados Unidos. Trata-se de uma manifestação de rejeição do sistema político, com Marine Le Pen, que se apresenta como estando em rutura com o sistema político, e com um movimento novo criado há um ano por Emmanuel Macron", explicou.
A professora no Centro de Estudos Europeus de Sciences-Po sublinhou que os partidos tradicionais juntos recolheram uma pequena percentagem do eleitorado, enquanto a esquerda radical e a extrema-direita conquistaram cerca de 40 por cento dos "votos da França rural e da França desindustrializada, da França em crise, no desemprego, das classes populares".
"O que é bastante impressionante é o fim dos grandes partidos que dominaram. Os Republicanos, partido da direita, e o Partido Socialista, que estava no poder com François Hollande, tiveram, grosso modo, um quarto do eleitorado. Já 40 por cento dos eleitores pronunciaram-se para mostrar o seu descontentamento, se juntarmos os votos de Mélenchon e os de Le Pen", afirmou.
Florence Faucher explicou que Jean-Luc Mélenchon, do movimento A França Insubmissa, beneficiou do voto de eleitores potenciais do socialista Benoît Hamon, que escolheram "o candidato da esquerda que teria mais hipóteses de estar na segunda volta".
A analista considerou que Mélenchon fez "um erro" ao não dar um conselho de voto aos seus eleitores para a segunda volta porque haverá a tentação de alguns votarem na extrema-direita não só para "expressarem o seu descontentamento", mas também porque "há similaridades entre os programas ao nível económico e sobre a Europa".
"É verdade que sociologicamente uma parte dos eleitores pode preferir um voto de protesto e votar Le Pen. Mas uma boa parte dos seus eleitores vai optar pelo voto branco, nulo ou pela abstenção. Por isso, nada está definido para a segunda volta", indicou, lembrando que "Jean-Luc Mélenchon disse que a decisão [de apoiar um candidato] será tomada pelo seu movimento".
Florence Faucher apontou que Emmanuel Macron tem mais hipóteses de vencer a 07 de maio porque "mostrou que não é nem de direita, nem de esquerda - ou de direita e de esquerda ao mesmo tempo - para reunir os dois lados".
"A relação de forças que se pode esperar, e tendo em conta que a classe política, incluindo os republicanos, apelam a votar por Macron contra Le Pen, não deixa grandes dúvidas quanto ao desfecho. Em contrapartida, a taxa de abstenção e o número de votos nulos pode dar uma percentagem que não seja fraca a Marine Le Pen", acrescentou.
A politóloga lembrou ainda que, desta vez, "as sondagens não se enganaram" e que, antes da primeira volta, elas "mostravam Macron como vencedor em vários cenários, nomeadamente contra Le Pen".
Neste contexto, uma vitória da líder da extrema-direita "seria surpreendente" e representaria "a mesma coisa que a eleição de Trump e o 'Brexit'" assim como "um choque para a Europa" - porque "é um programa antieuropeu" - e "um choque para o mundo ao ver a França escolher como Presidente um representante da Frente Nacional".
Os dados da primeira volta das eleições presidenciais em França, quando estavam apurados 97% dos votos, indicam que o centrista Emmanuel Macron obteve 23,86%, enquanto Le Pen conquistou 21,43%, disputando a segunda volta, dentro de duas semanas, a 07 de maio.
Em terceiro lugar ficou o conservador François Filon, com 19,94%, enquanto Jean-Luc Mélenchon (esquerda) obteve 19,62% dos votos.
O socialista Benoît Hamon obteve uma derrota histórica para o seu partido, com 6,35% dos votos.
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