Regionalização: 50 anos a adiar Portugal

Regionalização: 50 anos a adiar Portugal
| País
Fábio Lopes e Henrique Ferreira

A Regionalização começou a fazer parte da agenda política logo após o 25 de Abril de 1974. O processo, apontado como “chave” para o desenvolvimento do país, já estava previsto na primeira versão da lei fundamental que em 1976 a Assembleia Constituinte aprovou, contudo, quase 48 anos depois, a ambição permanece no papel. A dois meses do 50.º aniversário do 25 de Abril, esta é a forma mais adiada e que mais adiou Portugal.

Portugal é um dos países mais centralistas da Europa. A conclusão é da OCDE, que recomenda reformas para inverter a tendência, mas o processo de regionalização tem vindo a ser sucessivamente adiado pelos vários governos.

Em contagem decrescente para as eleições legislativas antecipadas de 10 de março, o tema ganha nova relevância, numa altura em que os partidos de todo o espectro político traçam compromissos e fazem promessas, de olhos postos no Parlamento.

São 19 forças políticas concorrentes e um acréscimo de mais de cinco mil eleitores inscritos face a 2022.

Mais de 10,8 milhões de eleitores residentes em território nacional e no estrangeiro serão chamados votar e escolher o partido que consideram que deve formar o próximo Governo ou no que pensam que os representa melhor, elegendo os 230 lugares de deputados da Assembleia da República para a próxima legislatura.

Mas, afinal, o que separa e aproxima as forças políticas da esquerda e da direita sobre a regionalização? O Porto Canal fez um levantamento e conclui que há vários defensores, muitas preocupações, mas pouco compromisso.

Qual o Estado da Arte?

Apesar de nas últimas legislativas, em 2022, haver quase um consenso sobre o horizonte 2024 para um novo referendo que colocava em sintonia total PS e PSD, hoje o cenário é radicalmente diferente. Com novos protagonistas à frente dos dois partidos, o processo sofreu um revés quando Montenegro, logo no congresso que o confirmou como novo líder dos sociais-democratas, em julho de 2022, anunciou um travão à intenção anunciada pelo antecessor Rui Rio.

O PS recuou e agora não vai mais além do que um compromisso para estabelecer um “roteiro para a regionalização.” Isto é, os os socialistas não se comprometem, para já, com um novo calendário. Pedro Nuno Santos diz que é fundamental o desenvolvimento harmonioso das regiões, fala num novo referendo (sem datas) e apontando o dedo ao PSD.

“A regionalização é um dos instrumentos importantes para empoderar as nossas regiões e, naquilo que elas fazem melhor, poderem elas gerir os seus próprios destinos. “É fundamental nós darmos cumprimento à Constituição”, defendeu o secretário-geral dos socialistas.

Atualmente, a Regionalização está novamente parada. O primeiro-ministro demissionário, António Costa, colocou um novo referendo, em 2024, como promessa eleitoral, mas com a consagração de Luís Montenegro como presidente do PSD colocou o plano em suspenso. Aliás, em abril, o Partido Socialista retirou mesmo a Regionalização da lista das Grandes Opções do Governo até 2026.

Mais à direita, a AD, que tem em Luís Montenegro as suas esperanças, não tem um posicionamento favorável sobre o tema, remetendo esta discussão para o futuro.

“Haveremos de discutir em Portugal um dia um eventual processo de regionalização. Não vale a pena estarmos aqui a perder tempo com discussões que não levam a lado nenhum.” E porquê? Porque estando em curso, há três anos, o processo de descentralização de competências, que “tem sido muito turbulento e não tem produzido resultados efetivos”, não faz sentido abrir um novo processo, ainda mais exigente”, frisou o líder do PSD.

Já o Chega mostra-se disponível para reforçar poderes dos municípios porque “a gestão dos territórios deve privilegiar uma política de proximidade e não extensões do Governo a nível local” com “excessivo centralismo em Lisboa, limitando a autonomia”, propondo ainda uma revisão das Comunidades Intermunicipais (CIM) e a criação de novas NUT.

Embora, em 2020, André Ventura, ainda como deputado único, dissesse que se estava “nas tintas” para aquilo que a Constituição previa e que a Regionalização só ia “trazer mais tachos” para os amigos dos políticos.

Para o PCP, avançar com a regionalização é um passo fundamental, com vista ao desenvolvimento do interior do país e ao combate “às assimetrias, ao despovoamento e à desertificação”.

O partido liderado por Paulo Raimundo já tentou, por diversas ocasiões, avançar com o processo. Em 2017 pressionou o Governo para definir um calendário, mas, 7 anos depois, ainda nada avançou.

A Iniciativa Liberal não descarta a regionalização, mas é apanágio do partido liderado por Rui Rocha fazer-lhe referência nos programas eleitorais.
Em 2022, o partido esclarecia que o assunto ainda era motivo de debate interno, mas os liberais são claros numa ideia: se a regionalização significar mais burocracia e ‘tachos’, o partido será contra, apesar de argumentar que a passagem “efetiva de competências, funções e atribuições para o poder local “é uma das melhores formas de aumentar a eficiência na gestão dos recursos públicos”.

Por seu lado, o PAN, na figura da sua porta-voz, Inês de Sousa Real, referiu, recentemente, numa entrevista ao Porto Canal, que o partido está ao lado do debate sobre a regionalização e que o mais importante é descentralizar.

Já o Livre sustenta que concretizar a regionalização é uma das propostas do programa eleitoral do partido, defendendo a criação da primeira assembleia cidadã em Portugal para discutir o tema.

O Bloco de Esquerda pede “um processo participado, aberto e democrático com vista à regionalização”. “É necessário dotar as estruturas intermédias do Estado de legitimidade democrática”.

Diferentes caminhos, que levam a diferentes destinos, mas a uma crucial discussão sobre a gestão do território nacional.

O arranque do processo após a queda da ditadura

Com o fim do regime de Salazar e Caetano que imperou no país durante mais de quatro décadas, Portugal preparava-se, em 1976, para votar a Constituição. O documento previa, logo desde a sua versão original, a Regionalização e o PSD era até o partido que mais vigorosamente defendia a reforma.

Anos mais tarde, em 1980, Francisco Sá Carneiro chefiava o Governo e falava na importância de uma “democracia regional”. Do outro lado estava Mário Soares que, em oposição, nunca foi entusiasta da ideia.

Contudo, foi a partir de meados da década de 1990 que a discussão em torno da Regionalização em Portugal se intensificou. Em 1991, o governo da Aliança Democrática (AD) chefiado pelo social-democrata Aníbal Cavaco Silva e composto por vários regionalistas notáveis, como Luís Valente de Oliveira e Miguel Cadilhe, aprovava a Lei-quadro das Regiões Administrativas.

Os anos seguintes ficaram marcados por um aceso debate sobre a delimitação de um mapa regional para Portugal. Na revisão constitucional de 1997, Marcelo Rebelo de Sousa, à data líder do PSD, impôs ao governo de António Guterres que o processo tivesse de ser obrigatoriamente submetido a referendo.

Esta reforma constitucional é por vários especialistas considerada como uma forma de “armadilhar” a regionalização. No entender de António Cândido de Oliveira, Professor Catedrático jubilado da Universidade do Minho, a reforma está bloqueada por um “novelo constitucional.”

Referendo com resultado esclarecedor

Em 1998, a Regionalização poderia ter mesmo avançado, mas o referendo apresentado aos portugueses, na sequência da revisão constitucional de 1997, foi chumbado e rejeitado por larga margem. Após uma campanha que muitos consideraram tóxica e assente no medo e na desinformação, cerca de 61% dos votos foram contra a ideia de criar novas regiões em Portugal continental e, com o chumbo, o assunto da Regionalização ficou na gaveta por mais 25 anos.

Curiosamente, foi o grande opositor de sempre da Regionalização quem trouxe o tema de volta ao debate político. Foi no congresso nacional de municípios, em 2021, que Marcelo Rebelo de Sousa sugeriu que a Regionalização voltasse a ser debatida.

No mesmo ano, António Costa e Rui Rio assumiam o mesmo compromisso conjunto para a realização de um novo referendo em 2024, que acabou por não avançar, sendo ainda incerto o futuro em relação à reforma mais adiada do Portugal democrático.

 
 
 
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