Transporte coletivo foi "a grande revolução funcional" no Porto, defende Domingos Tavares

Transporte coletivo foi "a grande revolução funcional" no Porto, defende Domingos Tavares
Universidade do Porto
| Porto
Porto Canal/Agências

A introdução do transporte coletivo, no século XIX, foi "a grande revolução funcional" no Porto, contribuindo para "o sentimento de pertença de muitos portuenses à sua cidade", defende o arquiteto Domingos Tavares no novo livro "Cidade de Pedra".

"A grande revolução funcional, e de extensão do sentimento de pertença de muitos portuenses à sua cidade, resultou da introdução dos sistemas mecânicos de transporte coletivo", refere o arquiteto e professor emérito da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (FAUP) no livro "Cidade de Pedra", que é apresentado na quinta-feira.

Em entrevista à Lusa, Domingos Tavares recordou a "expressão do pessoal que vive na Foz e diz 'vou à cidade', 'vou ao Porto'", que, segundo o arquiteto, tem raízes numa falta de sentimento de pertença à cidade, originalmente.

Assim, a partir de 1872, com a introdução do carro americano e depois o elétrico, estabelece-se "uma ligação mais eficaz e a partir daí começa-se a dar a coesão", defende.

Com as ligações à Foz e a Matosinhos dá-se uma "verdadeira revolução no sistema de transportes urbanos que passou a dispor de uma nova referência, a Estação de Recolha da Boavista", conhecida pelo termo francês 'remise'.

A praça da Boavista passa a rotunda, recebendo também o comboio vindo da linha da Póvoa de Varzim, constituindo-se como "um ponto fulcral de referência metropolitana", com ligação ao mar pela nova avenida homónima.

O advento do comboio influencia também "todas as terras servidas por caminho de ferro" à volta do Porto, que "ganham alguma dinâmica e alguma importância local por força dos comércios que são feitos a partir dos abastecimentos do centro do Porto".

A cidade e os serviços de transporte estendiam-se até aos limites da Estrada da Circunvalação, construída para servir como barreira administrativa e de cobrança de taxas, bem como para sul, através da nova Ponte Luís I.

Em 1932, o engenheiro Ezequiel de Campos apresenta o seu Prólogo para o Plano para a Cidade do Porto, defendendo que o Porto "não poderia ser só o contexto da área administrativa da cidade".

"O complexo Porto, Gaia e Matosinhos deviam constituir uma unidade urbana coerente e única. Portanto, a cidade metropolitana", resume Domingos Tavares à Lusa.

Já em 1952, Antão de Almeida Garrett introduz uma "ideia de circulação a partir de uma ponte" - que viria ser a Ponte da Arrábida - criando uma "linha circular estruturante para todos os lados", ou seja, "aquilo que será hoje a VCI [Via de Cintura Interna]", segundo Domingos Tavares.

"A ideia durante todo o século XX, particularmente a partir do plano do Almeida Garrett, é o automóvel", resume o arquiteto.

No primeiro Plano Diretor Municipal, coordenado pelo urbanista francês Robert Auzelle, "todo o desenho é para garantir a circulação do automóvel", afirmando-se como "um plano zonal" entre "funções, equipamentos e equilíbrios ao nível do funcionamento interno", explica Domingos Tavares.

"Tanto que depois aparecem os parques de estacionamento, em rede, dos quais só se fez o Silo Auto, mas a ideia era fazer mais 'Silo Autos'", inclusive um na zona da Rua do Barredo, na Ribeira, com acesso pela Sé, "que desfazia aquilo tudo".

Segundo Domingos Tavares, "o domínio do automóvel marca completamente a cidade a partir da segunda metade do século XX", algo que se expande regionalmente.

"No final do século XX, o Porto já era uma estrutura metropolitana, centro simbólico de uma conurbação que se estendia de Espinho a Vila do Conde, com ramificações até Braga e Guimarães a norte e a Ovar ou às terras de Santa Maria da Feira e Estarreja a sul", resume a publicação.

Na cidade, apenas o Metro do Porto "redimiu o abandono da antiga rede de elétricos", aproveitando também o canal da antiga linha da Póvoa de Varzim, permitindo "assinalar uma visão integrada do sistema urbano" muito através da sua arquitetura.

O livro "Cidade de Pedra", editado pela Dafne, é apresentado na quinta-feira às 21:30 no Cinema Passos Manuel, no Porto.

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