Rui Moreira acusa TdC de "extravasar competências" no chumbo ao Matadouro do Porto
Porto Canal com Lusa
O presidente da Câmara do Porto acusou esta segunda-feira o Tribunal de Contas de “matar o projeto” do Matadouro com a recusa do visto prévio à empreitada, numa “intromissão inadmissível” que “extravasa competências”, sem acolher “a separação de poderes”.
Atualizado 05-02-2019 11:28
“A separação de poderes não é acolhida pelo Tribunal de Contas [TdC]. Este tribunal entende que pode extravasar as suas competências e tomar as suas decisões de acordo com uma perspetiva política, diria ideológica, que não encontra fundamento legal ou constitucional. O que deve preocupar o TdC não são as questões que se prendem com a oportunidade da escolha, mas o cumprimento da estrita legalidade da despesa” que, no caso, é claramente definida, concreta e balizada pelo concurso e contrato e “indubitavelmente menor do que qualquer alternativa”, afirmou o independente Rui Moreira em conferência de imprensa na Câmara do Porto.
O autarca revelou que a autarquia “não deixará de apresentar recurso” relativamente ao projeto que é um ‘game changer [alavanca de mudança]’ da cidade e do país, pedindo ao Presidente da República, ao Parlamento e ao Governo que percebam ser impossível “governar uma cidade cumprindo a palavra dada ao eleitor se se continuar a permitir que órgãos não eleitos extravasem as suas funções e violem o princípio da separação de poderes”.
O Tribunal de Contas (TdC) recusou o visto "ao contrato de empreitada" da Empresa Municipal (EM) Go Porto para a reconversão e exploração do Antigo Matadouro Industrial do Porto, uma obra de dois anos e 40 milhões de euros.
Em causa está a adjudicação à Mota Engil, vencedora do concurso público lançado pela Câmara do Porto, da “reconversão e exploração” do antigo matadouro, na freguesia de Campanhã, ali instalando “empresas”, museus (o Museu da Indústria ficará lá sediado), reservas de arte, auditórios, espaços expositivos e equipamentos sociais”.
“Estamos sempre disponíveis para ter ajuda. Estamos a pedir ajuda. É um pedido para que o PR, o Parlamento e Governo olhem para o que já foi referido na cimeira de Sintra relativamente à questão dos vistos prévios”, explicou Rui Moreira, quando questionado pelos jornalistas sobre o apelo.
O presidente da câmara observou ainda que “não é possível governar uma cidade quando sucessivas entidades têm o direito de veto sobre decisões soberanas e legais do município”.
Moreira criticou que a recusa de visto do TdC tenha sido dada “no último dia” do prazo, dizendo estar em causa “uma opção política”.
“Esgotar o tempo é, em si, um facto político”, vincou.
O independente observou ainda que, “se era para chumbar o modelo”, o TdC podia tê-lo feito em agosto, quando o processo lhe chegou às mãos.
“Com isto, perderam-se seis meses”, lamentou.
O autarca revelou que, na sexta-feira, o TdC comunicou a decisão à empresa municipal Go Porto e esta apenas hoje recebeu o acórdão com os fundamentos da decisão.
Moreira disse desconhecer o documento mas vincou estar em causa uma “intromissão inadmissível que põe em causa a soberania dos municípios”.
Para o independente, as perguntas que foram feitas pelo TdC “são a prova inequívoca de que a separação de poderes não é acolhida” por aquele órgão.
“Não pode o TdC assumir-se como uma 'troika' interna, com poderes arbitrários para permitir ou não permitir, a seu bel prazer, que os executivos municipais decidam com o que entendem ser as suas opções políticas”, notou.
Moreira referiu-se ainda à instituição como “um tribunal que contabiliza os seus vistos prévios, como quem, no lugar da 'troika', se obriga a chumbar a vontade dos portuenses” e “dos portugueses”.
“Quantas vezes mais uma Mota Engil estará disponível para se ocupar com um concurso, apresentar um projeto contratado ao arquiteto que assina o Estádio Olímpico de Tóquio, criar uma empresa própria, prestar caução e arriscar para, meses após ganhar, lhe dizerem que, afinal, alguém algures diz que não”, afirmou.
De acordo com o autarca, a câmara “não deixará de apresentar recurso, desde logo porque há responsabilidades contratuais junto do adjudicatário que foram incrementadas pelas exigências do TdC e que resultaram numa mera futilidade”.
Moreira recordou que a reconversão do matadouro “foi unanimemente reconhecida como um projeto essencial para a regeneração urbana da zona oriental, transformando o edifício desativado há cerca de 20 anos num equipamento âncora de reabilitação urbana”.
“O projeto é um motor para uma zona da cidade que sucessivamente o poder desvalorizou ou não foi capaz de promover. É um projeto de e para o Porto e da região. É um projeto nacional e inédito, pela capacidade de mudar o território. Creio que foi isso que o PR quis dizer ao compará-lo, na capacidade de mudar, à Expo 98”.