Legislativas 2015

"As sondagens"

José Palmeira - 24-09-2015 11:27:41

“Se as eleições legislativas fossem hoje o partido A ganhava com X por cento”. Quantas vezes se ouviu esta afirmação abrir os noticiários televisivos das 20 horas? De que forma encarará a audiência este tipo de anúncio? Será ele legítimo ou se se estivesse no plano comercial estaríamos perante publicidade enganosa, logo punível nos termos legais?

Nunca como hoje a sondagem ou o estudo de opinião estiveram tão presentes no nosso quotidiano. Até 2 de outubro, último dia da campanha eleitoral, está previsto o anúncio diário do resultado de sondagens. Até que ponto o eleitorado é sensível à informação de um estudo de opinião? Qual a credibilidade que lhe atribuirá? Será que esse elemento tem influência no seu sentido de voto?

A proliferação de sondagens é o primeiro indicador de que produzem efeito. Os órgãos de comunicação social que as divulgam ganham audiência com isso, o que significa que à luz do princípio da oferta e da procura o mercado funciona. É verdade que a sua frequência a pode banalizar e retirar-lhe impacto, mas sendo os media atores políticos (não confundir com partidários) não deixarão de as utilizar como forma de influenciar a campanha eleitoral.

De que forma é que uma sondagem interfere nas eleições? Desde logo torna-se um dos temas da campanha o seu comentário pelos protagonistas, sejam eles candidatos ou analistas políticos.

O voto dos eleitores é ditado por diferentes razões. Há quem encare um partido político como um clube desportivo e a sua afetividade leva-o a votar sempre nesse partido, independentemente de qualquer juízo de valor conjuntural. Neste caso, as sondagens não produzem qualquer efeito no voto deste eleitor.

Uma parte do eleitorado, que os estudos de opinião também procuram captar, são indecisos que poderão ser sensíveis àquele que é o pensamento dominante expresso nas sondagens. Existe ainda o eleitor que gosta de votar no partido que se espera seja o vencedor como forma de ele próprio se sentir como tal.

Uma sondagem influencia mais significativamente o eleitor que está disponível para o chamado “voto estratégico”, mais vulgarizado como “voto útil”. Este eleitor abdica de votar no partido da sua simpatia para ajudar a evitar aquilo que considera um mal maior que será a vitória de um campo (ideológico) antagónico do seu. Neste caso funciona a dicotomia direita-esquerda, com o eleitor a votar no partido da sua área política que esteja mais próximo de vencer as eleições. É um voto mais pela negativa do que pela positiva (impedir a direita ou a esquerda de vencer) que ocorrerá com tão maior frequência quanto os resultados das sondagens apontarem para um empate técnico entre um partido mais à direita e outro mais à esquerda do espetro partidário.

Outra repercussão não despicienda de uma sondagem é o ânimo que confere ou retira às candidaturas. A chamada “dinâmica de vitória” tem reflexos na mobilização da máquina partidária e sendo hoje as campanhas muito mediatizadas isso acaba por persuadir os próprios eleitores.

Uma questão incontornável quando se fala de sondagens é a sua credibilidade. O assunto é pertinente dado que, como se vê, elas podem influenciar o voto dos eleitores. Ainda que o possam fazer de uma forma residual, isso ganha expressão e pode ser decisivo quando um ato eleitoral se decide por uma pequena diferença entre as candidaturas mais votadas. Neste ponto teremos, mais uma vez, que evocar as leis do mercado que se baseiam no princípio da confiança nos produtos. É necessário atender à credibilidade que conferimos ao órgão de comunicação social que divulgou a sondagem que por seu turno irá procurar não defraudar o consumidor, encomendando a sondagem a uma empresa que lhe mereça confiança. Sem consumidores, ambos – órgão de comunicação social e empresa de sondagens – estão condenados ao fracasso.

Antes no Reino Unido e mais recentemente na Grécia assistimos a resultados eleitorais diferentes daqueles para que apontavam a generalidade das sondagens. Isso não significa que os estudos de opinião tenham sido mal feitos ou manipulados, até porque a proliferação de empresas nessa área é o primeiro garante de que isso dificilmente acontecerá. Tanto num caso com no outro – diferentes, porque no Reino Unido o sistema eleitoral é maioritário, com círculos uninominais, enquanto na Grécia o sistema eleitoral é proporcional, com círculos plurinominais e um bónus de 50 deputados para o partido mais votado – tem que se encarar a hipótese de as próprias sondagens terem influenciado o voto de uma percentagem significativa de eleitores, o que só será captável pela sondagem à boca das urnas, isto é, efetuada no próprio dia das eleições.

Toda a dinâmica e complexidade aqui descritas alertam para a necessidade de defesa do consumidor. A política é uma atividade demasiado séria – pela implicação que tem na vida dos cidadãos – para ser objeto de manipulação. Já Aristóteles, no século IV antes de Cristo, apontava a demagogia como uma caraterística do discurso político. A melhor forma de um cidadão se defender não é perorar para que a realidade seja diferente, proibir a divulgação de sondagens no período eleitoral – impraticável na era da internet – ou exigir objetividade aos políticos durante as campanhas eleitorais, mas sim investir no seu próprio conhecimento acerca da forma como funciona o sistema político, tanto no plano institucional como dos atores.

É por isso que a reintrodução - infelizmente só a título de opção - de uma disciplina de Ciência Política nos currículos do ensino secundário foi uma boa medida. Só com cidadãos melhor formados e mais bem informados haverá qualidade na política - os políticos tendem a ser o espelho da sociedade que os gera. Nesse dia já não se ouvirá o pivô de um qualquer telejornal afirmar convictamente que se as eleições fossem naquele dia o resultado seria X. A não ser que a democracia eletrónica se instale e os eleitores possam responder, às 20 horas, em quem é que estão dispostos a votar. Mas este seria assunto para um outro artigo.

 

José Palmeira
Centro de Investigação em Ciência Política
Universidade do Minho

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