Aos 74 anos, Júlia foi posta na rua no Porto pelo novo senhorio

Aos 74 anos, Júlia foi posta na rua no Porto pelo novo senhorio
Foto: Ana Francisca Gomes | Porto Canal
| Porto
Ana Francisca Gomes

Júlia, de 74 anos, foi despejada na manhã de terça-feira do apartamento no Porto onde vivia desde 2007. A data do despejo não foi comunicada à doente cardíaca, que à hora em que viu a sua fechadura ser trocada não tinha ainda teto sob o qual passar a noite. A equipa de patrulha da PSP que realizou a ação não foi acompanhada de qualquer representante da Segurança Social e encaminhou a idosa para um dos balcões do Serviço de Atendimento e Acompanhamento Integrado (SAAS).

 
 
 
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À porta não há caixas ou malas que façam prever que alguém está prestes a deixar aquela habitação. “Dona Júlia, vou levar-lhe estes dois sacos para baixo, está bem? Para já só estes dois devem chegar”, ouve-se um agente da Polícia de Segurança Pública dizer das escadas do primeiro andar. No apartamento na Rua do Capitão Pombeiro, Júlia foi surpreendida por uma ação de despejo que - embora soubesse que mais cedo ou mais tarde aconteceria - nunca chegou a ter data marcada. Na passada quinta-feira, foi-lhe colada na porta uma notificação para a entrega do imóvel, mas sem data. Em menos de duas horas, a mulher de 74 anos com problemas cardíacos empacotou o que conseguiu de uma vida inteira.

A casa onde vive há quase duas décadas foi vendida em setembro de 2021, com o novo proprietário a optar por não lhe renovar o contrato e a estipular outubro de 2022 como a data de saída. Uma disputa em tribunal procurou adiar o despejo, sem sucesso. Apesar de ter assinado um contrato em outubro de 2007, a verdade é que já morava no imóvel desde janeiro do mesmo ano - facto que ficou provado em tribunal num processo com o anterior senhorio e que lhe permitiria uma renovação automática do contrato por mais cinco anos com o novo senhorio.

Apesar de consciente daquele que era um despejo iminente, Rosa Antunes Lopes, advogada da inquilina, conta ao Porto Canal que a agente de execução nunca chegou a marcar uma data para concretizar a vontade de Júlia em entregar de forma voluntária o imóvel. “A agente está mandata e tem um despacho de juiz que a autoriza a fazer despejo, mas o despacho do juiz também diz que a mesma também tem que salvaguardar o que está previsto na lei, designadamente que à Julia sejam garantidas as condições de ter onde possa pernoitar”, contextualizou.

Na manhã desta terça-feira, uma patrulha da PSP realizou o despejo e foi um dos agentes que ao ver que a inquilina não tinha alternativas fez o contacto com a segurança social. “Vamos levar esta senhora para a associação ‘Benéfica E Previdente’, em Paranhos, tal como nos indicaram”, é dito ao Porto Canal por um dos agentes.

Porto Canal

À porta de casa de Júlia vão-se juntando pessoas. Representantes dos movimentos ‘Habitação Hoje!’ e ‘Porta a Porta’ foram avisados pelo inquilino do andar de cima da presença das autoridades, naquela que foi uma tentativa para ajudar a vizinha. Os agentes vão descendo com os pertences de Júlia enquanto um homem acompanhado pelo novo senhorio muda a fechadura. “Alguém quer adotar um gato?”, brinca um dos agentes. O tom bem disposto não cai bem e faz-se silêncio.

Entre lágrimas, Maria Júlia tenta falar com os jornalistas, mas pouco consegue dizer para além de revelar que já se inscreveu na Domus Social para obter habitação camarária. Com ela vive há cerca de 10 anos F., de 75 anos. “Trabalhávamos juntas, fazíamos casamentos. O marido tratava-a mal. Pediu-me ajuda e deixei-a vir para aqui morar”, diz a moradora que já pagou a renda do mês de junho.

As duas septuagenárias são levadas no carro de patrulha da PSP. Para trás fica o gato, para quem o vizinho tenta encontrar solução. “A Dona Júlia se fica sem o gato … morre de desgosto”. Ao ver o aparato, uma mulher aproxima-se. “O que se passa?”, é a pergunta prontamente respondida. “Fazem-lhe isto com a idade que ela tem? Isto é de uma maldade muito grande”, atira.

Contactada pelo Porto Canal, a Câmara do Porto esclarece que a idosa formalizou uma candidatura junto da Domus Social a 22 de janeiro de 2024, encontrando-se na posição 433 da lista de espera. A autarquia liderada por Rui Moreira informa ainda que a mulher pode procurar uma resposta imediata junto do SAAS – Serviço de Atendimento e Acompanhamento Social, bem como através da Segurança Social, pela Linha Nacional de Emergência Social. O Porto Canal tentou ainda contactar o instituto público, mas sem resposta.

Para Júlia e F., a primeira noite foi passada num quarto de uma pensão indicado pela Benéfica Previdente, o SAAS da área de Paranhos. Resta agora saber o que o amanhã reserva às duas portuenses. O futuro daquela que foi a sua casa, esse, está já definido. Será mais uma a constar num dos portais imobiliários da cidade, soube o vizinho através do novo proprietário.

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