Associação de empresas florestais diz que estratégia de prevenção de incêndios deve ser repensada

Associação de empresas florestais diz que estratégia de prevenção de incêndios deve ser repensada
| País
Porto Canal / Agências

A gestão de faixas de combustível em terrenos florestais visa prevenir fogos rurais, mas a ANEFA – Associação Nacional de Empresas Florestais, Agrícolas e do Ambiente questiona a limpeza anual e defende que a estratégia deve ser repensada.

“Não entendemos muito a necessidade de repetir anualmente, para os padrões que estão a ser exigidos, ou seja, a altura da erva e esse tipo de situações”, afirmou o presidente da direção da ANEFA, Pedro Serra Ramos, em declarações à Lusa.

O engenheiro florestal acrescentou que as limpezas anuais, para a associação, “têm uma preocupação acrescida”: em muitos casos as pessoas focam-se em limpar as áreas em que é obrigatório, “mas depois deixam para trás a gestão das áreas florestais em si”.

“Ou seja, como o dinheiro não chega para tudo, aquilo que acaba por se notar é que há uma preocupação - o pouco dinheiro que há serve para limpar, para não serem sujeitos a coima -, mas depois fica a gestão florestal por fazer, porque já não há dinheiro”, explicou, admitindo que isso possa não ser “assim tão positivo do ponto de vista da prevenção” dos fogos rurais.

Para o dirigente, estará na altura de “voltar a sentar os diferentes atores que participam nisto à volta da mesa”, para discutir “se vale a pena continuar com esta estratégia”, porque muitas vezes é limpa a faixa dos 50 metros ao redor de um edifício “e depois o resto é uma desgraça”.

Segundo o mais recente relatório anual do Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais, de 2022 – o documento de 2023 será entregue ao Governo em breve –, foi reportada a “execução global de 73.248 hectares (menos 14.210 hectares face a 2021, uma diminuição de 17%), não se atingindo o valor acumulado estabelecido pelas entidades”.

O documento reporta, em termos de gestão de combustível, 65.693 hectares (ha) em 2019, 70.387 ha em 2020 e 88.058 ha em 2021.

Estes números não incorporam, “por falta de mecanismos adequados de reporte, a maioria das entidades privadas (proprietários florestais e agrícolas, individuais ou coletivos) e autarquias”, que têm um peso bastante relevante, refere-se no relatório.

Em relação ao Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), o decréscimo deveu-se à diminuição de 50% da área executada com recurso ao fogo controlado e queimadas (1.829 ha) e diminuição de 10% da área executada em mosaicos (14.523 ha), face ao ano anterior.

O documento regista ainda o ligeiro aumento na execução de rede primária (7.871 ha) e na proteção de áreas de elevado valor através de 18 projetos-piloto (1.901 ha).

O relatório de 2022 sublinha ser “cada vez mais urgente o reforço de medidas que estimulem o envolvimento privado e o consequente investimento em medidas de silvicultura, boa gestão após exploração florestal”, entre outras.

A limpeza de terrenos agrícolas e florestais, a concretizar até 30 de abril, padece, no entanto, da escassez de mão-de-obra por todo o país.

“Há zonas mais afetadas que outras, todas as empresas estão a sofrer um bocadinho com falta de pessoal qualificado para fazer os trabalhos”, referiu Pedro Serra Ramos, salientando que as empresas, como perceberam que a situação “vai ter continuidade”, foram investindo na mecanização.

A realidade é também conhecida da Federação Nacional de Associações de Proprietários Florestais (FNAPF).

“Já há robôs também de limpeza. Já há outros sistemas mais avançados, mecanizou-se muito”, disse o presidente, Luís Damas, reconhecendo que haverá sempre dependência de mão-de-obra, para trabalhos manuais ou trabalhadores especializados na operação das máquinas.

Em zonas como Abrantes, distrito de Santarém, ainda é possível encontrar trabalhadores portugueses, enquanto outras empresas “têm já equipas constituídas por imigrantes”, em zonas como Viseu ou Oliveira do Hospital, onde há muita indústria.

O dirigente avançou que “as regiões do litoral têm alguma dificuldade de mão-de-obra”, até por no interior alguns trabalhos poderem ser complemento à atividade local.

Pedro Serra Ramos frisou que, “na maior parte dos casos”, os imigrantes também “não estão preparados para a realização destes trabalhos”.

“A tendência será cada vez mais procurarem soluções de mecanização que, de alguma forma, colmatam esta falta de mão-de-obra, porque é diferente” conseguir-se “atrair os jovens para trabalhar, por exemplo, com robôs e desmatação, do que para agarrar numa motorroçadora e andarem a cortar mato”, vincou.

Para Serra Ramos, a prevenção deveria ser feita a partir da gestão do espaço florestal, o que não tem acontecido, e “a prova está no nível de arborização”, que “é praticamente nula”.

“Os proprietários muitas vezes não têm receita disponível para pagar uma gestão profissional florestal e, portanto, deveria ser aí que o Estado devia investir muito mais do que na limpeza pura e dura de pequenas áreas, apenas para proteção junto aos espaços urbanos”, defendeu.

Passados sete anos dos trágicos incêndios de 2017, vincou, “já se deveria ter apontado a estratégia para uma gestão profissional da floresta”, em vez de “apostar apenas na sensibilização das pessoas”, e de preparar o futuro da prevenção da floresta em relação às alterações climáticas e fogos rurais.

“Está na altura de nos sentarmos à mesa e fazer aquilo que […] pode ser chamado de um plano de sustentabilidade da floresta portuguesa”, propôs o responsável da ANEFA, quando, a mais de metade do prazo e só com 870.000 árvores plantadas, se está longe da meta da União Europeia da plantação de 3.000 milhões de árvores no espaço europeu.

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