Brasília, o shopping que luta para não ser esquecido pelos portuenses
Catarina Cunha
Desde janeiro de 2023 que o barulho de máquinas é a nova “banda sonora” do Shopping Center Brasília. As obras, que prometem dar uma alma renovada ao edifício com quase meio século de existência, impactam o negócio dos poucos lojistas que ainda resistem e que olham para o futuro com “alguma interrogação”.
Quem entra pela porta principal do Shopping Center Brasília, em frente à Rotunda da Boavista, “tropeça” em andaimes e taipais que se acumulam à entrada. As obras de requalificação arrancaram em janeiro de 2023, um ano depois do previsto, com o objetivo de transformar completamente as áreas comuns, transportando o primeiro centro comercial da cidade do Porto para o século XXI. Das três fases projetadas, duas encontram-se já concluídas, estando agora em falta a intervenção no piso principal que começou no início deste ano.
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Apesar da empreitada, os comerciantes nunca chegaram a fechar portas, uma decisão que agora reconhecem ter prejudicado alguns negócios. “Neste momento, as obras só trazem lixo”, reconhece João Pereira, proprietário do Restaurante D. Giovanni há 47 anos. O empresário confessa que sentiu uma quebra de 80% no movimento do seu estabelecimento, situado na zona “fantasma” do edifício. “Aqui, não passa ninguém, só aqueles clientes diários de quem nós temos um e-mail, ou telefone, a quem dizemos todos os dias aquilo que podem almoçar. Às vezes vêm, outras vezes não”, lamenta.
Por seu lado, Ricardo Gonçalves, proprietário de uma ourivesaria há 15 anos, reconhece que o seu negócio também sofreu com a empreitada. Entre o “pó” que pairava no ar e os taipais que esconderam o espaço, os clientes afastaram-se, esqueceram-se e acabaram por não regressar.
Sobre este tema, o administrador do Brasília, Luís Pinho, recorda que a decisão de manter os espaços comerciais abertos ao público partiu dos proprietários das lojas e dos próprios lojistas, em conjunto com a administração. “Tentamos colmatar a falta de visibilidade com mais informação e divulgação”, acrescenta, assumindo não acreditar que as obras de renovação tenham tido “um prejuízo de grande natureza” para os comerciantes.
Apesar das dificuldades na faturação, os lojistas reconhecem que já é possível constatar uma nova identidade no interior do edifício. “Está melhor do que nos últimos anos, em que esteve esquecido e degradado”, salienta Ana Paula Santos, Presidente da Associação dos Comerciantes e proprietária de uma ourivesaria. A empresária destaca as melhorias na iluminação e elogia a nova apresentação dos WC 's comuns.
Os clientes também não ficam indiferentes à “nova cara” do Brasília. Nair Rocha, que frequenta este centro comercial há aproximadamente quatro anos, perspetiva “um futuro promissor”. Já Graça Queiroz, que faz do Brasília a sua “segunda casa” desde a abertura de portas, confessa que “antigamente não faltava nada” ao shopping, mas que atualmente o espaço “está uma miséria”, com “menos clientes e muitas lojas fechadas”.
Uso dos WC’s passou a ser cobrado
Recentemente, uma taxa de 50 cêntimos passou a ser cobrada a quem quiser utilizar os sanitários do centro comercial. A decisão não é vista com bons olhos pelos visitantes e lojistas que acreditam que a medida vai afastar ainda mais a clientela.
“Acho isso horrível, isto nunca se viu em lado nenhum. Há pessoas que saem daqui um bocado chateadas”, conta-nos Graça Queiroz.
Quem partilha da mesma opinião é o dono do restaurante D. Giovanni. João Pereira considera a situação vergonhosa e afirma que chega a ter clientes que passam pelo seu estabelecimento apenas “para pedir para ir à casa de banho porque não são pagas”.
Ao Porto Canal o administrador do Brasília explica que a decisão foi tomada “porque havia muita delinquência nas casas de banho” e, sobretudo, para evitar a “rápida degradação” dos WC 's. Luís Pinto refere ainda que todos os lojistas têm uma “entrada franca para a casa de banho” que pode ser, ou não, disponibilizada aos seus clientes.
Passado recordado com nostalgia
Inaugurado a nove de outubro de 1976, no “glamoroso e coqueluche da época”, como os lojistas mais antigos fazem questão de chamar, “fazia-se bicha para entrar” para visitar as primeiras escadas rolantes da cidade e as lojas de marca.
Os empresários que viram o Brasília nascer, crescer e amadurecer acreditam que a falta de movimento, apesar da boa localização, se deva a dois fatores: a ausência de lojas âncora e a existência de escritórios, algo que, na opinião dos comerciantes, ocupa os espaços vazios mas não cativa os clientes a visitarem o local.
Obras terminam no verão
A administração do centro comercial estima que a intervenção fique concluída até ao início do verão. Até lá, a incerteza e a esperança perduram nos corredores desta “casa”.
Alguns dos lojistas olham para o futuro “com alguma interrogação”, duvidando do impacto das obras de reabilitação na captação de novos públicos. Mas essa não é uma opinião unânime, com comerciantes a acreditar que o ‘refresh’ do Brasília trará “mais clientes”, sobretudo os jovens portuenses, e “mais movimento”, recuando à época em que havia atropelos para entrar no Shopping Center Brasília.