Táxi para a liberdade. A abandonada praça do Monte do Vale, em frente à cadeia de Custóias

Táxi para a liberdade. A abandonada praça do Monte do Vale, em frente à cadeia de Custóias
Foto: Pedro Benjamim | Porto Canal
| Norte
Pedro Benjamim

Em frente ao Estabelecimento Prisional do Porto há uma praça de táxis, mas hoje em dia poucos são os que param naquela postura (nome técnico usado para a praça). Poucos clientes, maior oferta de autocarros e dificuldades no estacionamento são algumas das razões para que a maioria dos taxistas tenha migrado para outras praças. O Porto Canal esteve à conversa com alguns deles para conhecer as histórias de quem conduz um táxi para a liberdade.

Foi António Gorito que fez com que fosse criada a postura do Monte do Vale, há mais de 30 anos, conta ao Porto Canal o filho José. O condutor do carro 42 seguiu o caminho do pai e, hoje em dia, é também taxista.

Aquela postura – ou praça de táxis – fica precisamente na Rua Monte do Vale, morada do Estabelecimento Prisional do Porto, a conhecida cadeia de Custóias.

Foi esse o motivo que levou à instalação daquela paragem, para que os visitantes e reclusos que saíssem em liberdade tivessem um carro à sua espera. Contudo, hoje em dia a realidade é diferente.

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José Gorito, taxista

Foi na postura do Padrão da Légua, a mais concorrida de Leça do Balio, que nos encontramos com José, taxista há 32 anos. Ainda trabalhou com o pai, que deixou a profissão há oito, mas pouco mais ficamos a saber. O telefone tocou com um serviço do outro lado linha e o taxista teve de seguir caminho para levar um cliente ao aeroporto.

À sombra de uma cabine telefónica estava o Sr. Pelicano. “Taxista há 38 anos”, diz ao Porto Canal.

Além da concorrência dos operadores de TVDE, também a paragem de autocarros próxima do Estabelecimento Prisional retira alguns dos clientes. “Eu às vezes até parava ali, ia lá na hora das saídas. Ia hoje, vou amanhã vejo os carros da Uber a carregar e sair, fiquei a pensar que não valia a pena ir para lá”, afirma o Sr. Pelicano.

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Sr. Pelicano, taxista

O taxista conduz um recente e imaculado Peugeot 3008. “Trabalho por conta própria. Eu fazia mais quilómetros há 38 anos, fazia o dobro dos quilómetros que faço hoje e eu tinha carros que sabe Deus para a gente aguentar as despesas. Agora temos carros novos e quase que nem os rompe. Está mesmo muito fraco”, desabafa.

No entanto, tinham passado dez minutos da primeira chamada e também o telefone do Sr. Pelicano toca. Atende o telefone e com um: “Estou sim boa tarde!” arrancou o taxista para mais um serviço.

A postura do Padrão da Légua ficou vazia, mas não por muito tempo já que o carro 88 por lá parou. O taxista deixou o automóvel e foi abrigar-se do sol nas galerias dos prédios ao lado.

Rui Manuel, tal como os colegas de profissão, tem preferência pelo Padrão da Légua, mas há alguns anos, tal como os reclusos recebem visitas, também a postura da cadeia de Custóias recebia a visita do taxista.

“Com o meu antigo carro, há uns 5 ou 6 anos, ao fim-de-semana, ia para lá para as quatro visitas de sábado e domingo e fiz serviços. Nunca me calhou aqueles grandes como antigamente de Mirandela e Vila Real, mas fiz trabalho. Há 10 anos ainda se fazia lá alguns serviços, depois é que foi quebrando”, lembra Rui Manuel.

Táxi da liberdade

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Táxi em frente ao Estabelecimento Prisional do Porto (cadeia de Custóias)

As reações de alguém que sai para a liberdade à primeira hora da manhã surpreendem os taxistas. Mesmo que já tenham feito algumas viagens deste tipo, cada uma traz uma história diferente.

“Uma coisa é ver um menino, que pegamos nele e vamos dar uma volta e nunca viu nada no mundo, e outra coisa é ver um adulto de boca aberta, com a cabeça de fora do carro. ‘Oh que carros são estes, que tipo de prédio, olha que construção!’”, as palavras são do taxista Rui Manuel recordando a viagem.

Apesar de não parar frequentemente na praça de táxis da cadeia de Custóias recorda algumas viagens que fez, uma delas com um intervalo de 12 anos. “Foi no táxi, comigo e com os pais”, lembra Rui Manuel a viagem de há mais de uma década. A pessoa que levava no carro “era um amigo de infância, de escola”.

Volvidos 12 anos foi o mesmo taxista a fazer a viagem de regresso. “Agora para o ir buscar foi igual. Os pais chegaram ao carro e fomos buscá-lo”, lembra.

Apesar de o amigo de infância ter estado sem liberdade a ligação do taxista à família manteve-se. “Nunca perdi contacto com os pais. Vou muitas vezes levá-los aos hospitais e ao centro de saúde”, remata.

“Têm telemóveis as crianças?”

Outro dos passageiros que saiu em liberdade fez o taxista Rui Manuel lembrar o momento que diz “surreal”. “Tive um que esteve 17 anos preso, que levei a Esposende e aquilo foi demais, foi surreal. Eu não acreditei que estava a ver um homem de 62 anos. O homem estava estupefacto, tudo para ele era uma admiração. Até uma simples rapariga de telemóvel a atravessar uma passadeira para ele fez muita confusão. ‘Têm telemóveis as crianças?’”, contou ao Porto Canal a viagem que aconteceu há cerca de “meio anito, sete ou oito meses”.

Dentro do táxi são muitas as conversas que surgem, mas quando é um ex-recluso que entra no carro raramente é o taxista a dar o primeiro passo. “Podem vir ressentidos e até ter má resposta” diz o Sr. Granja. “Se forem eles a começar a falar é uma coisa, mas eu tento sempre evitar sermos nós os primeiros a começar”, conta o experiente taxista do carro 56.

A gota de água

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Praça de Táxis da cadeia de Custóias (postura do Monte do Vale)

Quando a postura do Monte do Vale nasceu em frente ao Estabelecimento Prisional do Porto, em Custóias, ficava do lado oposto à cadeia. No entanto, anos volvidos, a postura migrou para o outro lado.

“Já fiquei sem um retrovisor, não sou o único”, atira Rui Manuel, apontando que o espaço para parar o carro naquela praça de táxis é reduzido.

“Se vier um camião se não somos nós a pegar no carro e a dar uma volta para o camião passar o camião não passa, porque se as árvores não estiverem bem cortadas eles batem com os taipais nas árvores e têm de fugir para o lado direito”, aponta o taxista.

Os taxistas deixam críticas dizendo que “o carro está metido dentro da via pública” e que “essa situação foi a gota de água para o desabituamento daquela praça”.

 
 
 
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