A volta ao mundo das polémicas em 1409 dias. O percurso do ministro com aspiração de ser mais
Henrique Ferreira
Pedro Nuno Santos chegou ao Governo em 2015 como secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares. Nessa altura foi o responsável por negociar com os partidos à esquerda o acordo da “geringonça”. Mas, em fevereiro de 2019, uma remodelação atirou-o para o Ministério das Infraestruturas e colocou-lhe na secretária a crise no setor da habitação e os problemas da CP e da TAP. Nos bastidores falava-se num presente envenenado, mas que o jovem 'prodígio' do PS aceitou já com os olhos postos num possível futuro como primeiro-ministro de Portugal. Quatro anos depois deixa o executivo, mas não deverá sair de cena, até porque continua com lugar no Parlamento e nas boas graças das figuras históricas do Partido Socialista
Em comunicado, o gabinete de Nuno Santos explicou que, “face à perceção pública e ao sentimento coletivo gerados em torno do caso da TAP, o ministro decidiu assumir a responsabilidade política e apresentar a sua demissão”. Mas a polémica indemnização de Alexandra Reis não foi o único caso “bicudo” com que o “jovem turco” do PS teve de lidar nos seus quatro anos enquanto ministro.
Os primeiros meses enquanto ministro
As grandes indemnizações, os prémios de produtividade e os salários altos da TAP não são de agora. Só no ano em que Pedro Nuno Santos chegou ao Ministério das Infraestruturas, a transportadora aérea nacional pagou prémios de 1,171 milhões de euros a 180 trabalhadores. O problema é que, também em 2019, as perdas da companhia foram de 118 milhões de euros.
Pedro Nuno Santos lembrava que a TAP "não podia aumentar os custos laborais"
Na lista dos premiados pela TAP estavam os nomes de Stéphanie Silva, a mulher do agora ministro das Finanças Fernando Medina, e da filha do ex-ministro da agricultura Jaime Silva.
Numa altura em que o Estado detinha apenas 50% do capital da TAP, Pedro Nuno Santos mostrava-se crítico das decisões da companhia área e, num comunicado, contestava a decisão da gestão privada de pagar prémios a dirigentes da empresa.
A “falta de confiança” na gestão privada da TAP começava assim a assombrar os dias do ministro. Com a chegada da pandemia a situação piorou e, com os aviões parados, Pedro Nuno Santos colocou em si próprio o peso de salvar uma TAP em que os “privados” já não queriam investir.
“A música agora é outra no que diz respeito à TAP”
Em 2020, a TAP voltava a pagar prémios a alguns dirigentes e Pedro Nuno Santos voltava a considerar o fenómeno “uma falta de respeito para com a esmagadora maioria dos trabalhadores”.
Mas perante um cenário negro nas contas da companhia área, o Estado português comprometia-se a ajudar. Apesar disso, Nuno Santos alertava: “a música agora é outra no que diz respeito à TAP”. Para o ministro, não se pode “dar uma mãozinha a quem não quer meter um tostão na empresa” e, por isso, “se é o povo português a meter dinheiro na TAP, é bom que seja o povo português a mandar”.
Uns meses mais tarde, o Governo comunicava assim a necessidade de plano de reestruturação para a TAP, que viria a ser aprovado pela Comissão Europeia um ano depois.
A relação com os pilotos, que “não ganham assim tão mal”
Pilotos da TAP acusam administração e Pedro Nuno Santos de "má gestão"
Pedro Nuno Santos percebeu que precisava de ser mais contido nas comunicações sobre a TAP, mas este ano voltou a entrar em campo quando os pilotos ameaçaram fazer greve.
Os resultados da reunião não foram conhecidos, mas a greve acabou desconvocada. Afinal a relação entre o ministro e os pilotos estava mais tranquila, depois de, no passado, ter revelado publicamente o salário destes profissionais, insinuando que em comparação com outras companhias na TAP “não se ganha assim tão mal”.
Aeroporto de Lisboa. A decisão unilateral e o “ralhete” de Costa
Entre casos e casinhos, Pedro Nuno Santos não teve anos fáceis no Governo. Mas foi já no último como ministro que surgiu a polémica mais grave. No final de junho, o ministro divulgou um despacho que anunciava a construção do aeroporto complementar do Montijo, a curto prazo, e Alcochete como solução final para o já antigo problema da sobrecarga do Aeroporto da Portela. A decisão não terá passado, no entanto, por António Costa, que acabou por revogar o despacho.
Nessa altura, a demissão de Pedro Nuno Santos esteve em cima da mesa, mas acabou por não acontecer. O “ralhete” de Costa terá sido suficiente e pouco tempo depois aparecerem os dois, lado a lado, no fim de uma reunião com o líder do PSD, onde o governo se comprometeu a ouvir a oposição e a estudar novas hipóteses para a localização da nova estrutura aeroportuária.
Reunião entre Pedro Nuno Santos, António Costa e Luís Montegro sobre o novo aeroporto
Os problemas na CP e o ataque ao colega das Finanças
Mas nem só de aviões e da TAP se fez o percurso de Pedro Nuno Santos no governo. Ao longo de quatro anos, o ministro lidou com as greves nas transportadoras de materiais perigosos, com problemas Groundforce e na CP.
Sobre a transportadora ferroviária nacional o ministro chegou a atacar diretamente João Leão, colega com a pasta finanças, acusando-o de não permitir a resolução dos problemas da empresa. “Se dependesse de mim o problema estava resolvido. Tínhamos um plano de atividades e um orçamento aprovado em tempo. A empresa não esperava meses para conseguir autorização para fazer as compras que são fundamentais para o seu funcionamento, não tínhamos uma dívida histórica durante tanto tempo sem a resolver”, afirmava o Ministro das Infraestruturas.
Mas a gota de água acabou por ser a saída de Nuno Freitas, que para Pedro Nuno Santos foi o “melhor presidente de sempre” da CP.
A ferrovia e o sonho do TGV
Com a TAP cheia de turbulência e a habitação num cenário cada vez mais complicado, Pedro Nuno Santos assumiu a ferrovia como prioridade. O Plano Ferroviário Nacional tornou-se na sua obra prima e a linha de alta velocidade na concretização de um sonho.
No Porto, em setembro deste ano, o ministro das Infraestruturas e da Habitação, dizia que a alta velocidade era “mais um passo na revolução da ferrovia”.
De recordar que o projeto do TGV prevê ligar Porto a Lisboa em 1 hora e 15 minutos, com um investimento superior a 4 mil milhões de euros.
António Costa e Pedro Nuno Santos estiveram juntos no Porto para a apresentação da linha de alta velocidade
Pedro Nuno Santos apanhado na teia das incompatibilidades
Poucos meses depois, nova polémica. O ministro das Infraestruturas e da Habitação tinha sido apanhado na teia das incompatibilidades.
Em outubro, o jornal Observador, noticiava que uma empresa detida em conjunto por Pedro Nuno Santos e pelo pai tinha beneficiado de um contrato público por ajuste direto. De acordo com a lei que estabelece o regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos a situação constituía uma incompatibilidade.
Apesar disso, nessa altura, o ministro garantia que não tinha violado a lei e que se tivesse que sair do Governo o faria “com sentimento de injustiça”.
Três meses depois o ministro acaba por não sobreviver à polémica que envolveu a recém nomeada secretária de Estado do Tesouro, Alexandra Reis, que recebeu da TAP uma indemnização superior a 500 mil euros.
Pedro Nuno Santos nunca escondeu a ambição de vir a ser primeiro-ministro