Relação manda repetir julgamento de ex-funcionário público da Madeira condenado por desviar 2 ME
Porto Canal com Lusa
Funchal, Madeira, 08 mai 2020 (Lusa) - O Tribunal da Relação de Lisboa determinou a repetição do julgamento por outro coletivo de juízes do antigo funcionário da conservatória da Madeira condenado a sete anos e seis meses, pelos crimes de peculato e falsificação de documentos.
No acórdão facultado à agência Lusa pelo defensor do arguido, Carlos Paisana, na avaliação feita pelo Tribunal da Relação, a decisão do tribunal de primeira instância da Comarca da Madeira "padece de vício de contradição insanável da fundamentação, além de outras patologias".
Por isso, ordena "o reenvio dos presentes autos para novo julgamento relativamente à totalidade do processo".
O documento, assinado pelas juízas desembargadoras Filipa Costa Lourenço e Cristina Santana, determina que esta audiência deve ser realizada "por outros juízes que não tenham integrado o tribunal coletivo que fez o julgamento, elaborou e assinou o acórdão recorrido".
Em 26 de setembro de 2017, no tribunal da Comarca da Madeira, o coletivo presidido por Teresa Miranda, coadjuvada por Elsa Serrão e Filipe Câmara, começaram a julgar António Manuel Góis, antigo funcionário da Conservatória do Registo Comercial e Automóvel do Funchal - e que foi presidente da Câmara da Ponta do Sol, na zona oeste da ilha da Madeira - acusado de desviar cerca de dois milhões euros.
Em 30 de abril de 2018, o coletivo da instância central do Funchal acabou por condenar o arguido, em cúmulo jurídico, a uma pena de sete anos e seis meses pela prática do crime de peculato (seis anos) e falsificação de documento (três anos).
A sua mãe, também arguida neste processo, respondeu pelos mesmos crimes, mas foi absolvida, uma sentença que já transitou em julgado.
O arguido foi ainda condenado a pagar dois milhões de euros, sendo mais de 1,2 ME à Região Autónoma da Madeira e 753 mil ao Estado português.
Os defensores Arnaldo Matos -- entretanto falecido - e Carlos Paisana decidiram recorrer da decisão para a Relação.
As juízas desembargadoras acabaram por fazer vários reparos à decisão, entre as quais "o vício de contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão", evidenciando "posições antagónicas e inconciliáveis", nomeadamente "sobre factos dados como provados os quais, sendo de sentido contrário, se anulam mutuamente".
"Dá como provado 'os dois lados da moeda', o existir e o não existir dos mesmos factos", sublinham.
Exemplifica com o dado relacionado com o facto de que o arguido ser dado como "o único na repartição em causa", que tinha "a responsabilidade exclusiva da escrituração de todos os valores da contabilidade da conservatória, para depois admitir, entre outros aspetos, que o livro dos emolumentos "era escriturado por todos os funcionários", que também "recebiam dos utentes os preparos e créditos".
Por isso, o Tribunal da Relação de Lisboa aponta que o acórdão da primeira instância "é detentor de uma contradição insanável de fundamentação".
"O acórdão recorrido é detentor de várias outras patologias" e evidencia "uma alteração substancial dos factos descritos na pronúncia", acabando por condenar o arguido "tendo por base novos factos", uma situação que "conduz, impreterivelmente, à nulidade" de algumas peças processuais, lê-se na decisão.
Menciona ainda o facto de o tribunal "estar a condenar o arguido por outro crime", porque este estava acusado de um crime de branqueamento, que foi alterado, "pelo que a decisão proferida pelo tribunal é nula, neste conspecto, devendo considerar-se como não produzindo quaisquer efeitos".
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