Covid-19: Cientistas chineses alertam para risco de se subestimar vigilância de doenças cardiovasculares
Porto Canal com Lusa
Redação, 26 mar 2020 (Lusa) -- Cientistas chineses alertaram para o risco de se subestimar a vigilância das doenças cardiovasculares, que, segundo estudos, predispõem as pessoas à infeção causada pelo coronavírus da covid-19.
O alerta foi expresso por Chengzhi Yang e Zening Jin, do Departamento de Cardiologia e Doença Macrovascular do Hospital Tiantan de Pequim, na China, país onde começou a pandemia da covid-19, em dezembro.
Num artigo de opinião publicado na quarta-feira na revista JAMA Cardiology, os dois investigadores referem, citando estudos feitos na China, que as pessoas que sofrem de doenças cardiovasculares crónicas são mais suscetíveis a uma infeção pelo coronavírus SARS-CoV-2 e mais propensas a condições de saúde críticas e à morte.
Contudo, segundo Chengzhi Yang e Zening Jin, "tem sido dada uma desadequada atenção à comorbidade das doenças cardiovasculares em doentes com covid-19".
Os dois cientistas assinalam que a covid-19 "pode potencialmente desestabilizar doenças como a insuficiência cardíaca e a doença coronária".
Por sua vez, "o agravamento de doenças cardiovasculares poderá exacerbar o controlo da covid-19", sustentam, realçando que "tem havido escassos dados" sobre os problemas cardiovasculares resultantes da covid-19.
Por isso, os autores do artigo de opinião defendem a vigilância continuada de complicações cardiovasculares decorrentes da infeção pelo novo coronavírus (família de vírus que pode provocar infeções respiratórias como pneumonia).
Adicionalmente, Chengzhi Yang e Zening Jin advogam a realização de mais estudos que permitam identificar fatores de risco que possam levar a um mau prognóstico da covid-19.
O artigo salienta que o diagnóstico da covid-19 tem sido mais difícil em doentes com insuficiência cardíaca crónica.
Por outro lado, tanto a covid-19 como a insuficiência cardíaca levam à hipoxemia (baixa concentração de oxigénio no sangue), que é o "mecanismo fisiopatológico básico que conduz à morte".
Doentes com infeção ativa de covid-19 "dificilmente sobrevivem" a um enfarte do miocárdio.
A hipoxemia gerada pela covid-19 pode suscitar fibrilhação auricular, que é a forma mais comum de arritmia cardíaca nos idosos, um dos grupos mais vulneráveis à infeção pelo coronavírus SARS-CoV-2.
No artigo de opinião, Chengzhi Yang e Zening Jin advertem que a proteína ACE2, que confere ao organismo proteção contra doenças cardiovasculares, como hipertensão, miocardiopatia hipertrófica, fibrose cardíaca, arritmia e aterosclerose, é a porta de entrada do novo coronavírus nas células.
Estudos anteriores citados pelos dois cientistas chineses concluíram que a terapia usada para ajustar os níveis da ACE2 ou evitar a perda da proteína em doentes com hipertensão, insuficiência cardíaca e cardiopatia isquémica pode aumentar o risco de infeção por SARS-CoV-2.
Por isso, Chengzhi Yang e Zening Jin pedem para que seja dada uma "atenção adicional" aos doentes com covid-19 e contactos próximos que estejam a usar esta terapêutica.
A dupla chinesa considera que deve haver mais estudos clínicos que explorem as possíveis ligações entre a terapia que ativa a proteína ACE2 e a suscetibilidade e o prognóstico da infeção da covid-19.
Chengzhi Yang e Zening Jin lembram que as doenças cardiovasculares lideram a lista de patologias de notificação não obrigatória no mundo e que numerosas pessoas com doenças cardiovasculares estão a usar a terapia que regula os níveis de ACE2.
Os dois autores alertam para a possibilidade de a covid-19, que é uma nova doença infecciosa aguda, se tornar numa epidemia crónica similar à gripe devido à "recombinação genética" do vírus.
"Portanto, devemos estar preparados para o reaparecimento da covid-19 ou de outros coronavírus", avisam Chengzhi Yang e Zening Jin.
O coronavírus SARS-CoV-2, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou mais 480 mil pessoas em todo o mundo, das quais morreram perto de 22.000.
Em Portugal, onde vigora o estado de emergência até 02 de abril, registaram-se 60 mortes e 3.544 infeções, de acordo com o balanço feito hoje pela Direção-Geral da Saúde.
Os idosos e os doentes crónicos são apontados como os grupos mais vulneráveis à doença.
ER // JMR
Lusa/Fim