Serviço Nacional de Saúde vai ser "mais pobre", crê diretor de faculdade de Medicina
Porto Canal / Agências
Porto, 12 dez (Lusa) -- O diretor da Faculdade de Medicina do Porto, Agostinho Santos, considerou hoje que as pessoas "têm razão para ter medo" sobre o futuro dos cuidados de saúde, porque o sistema público vai ser "mais pobre".
"Têm razões para ter medo de que nos próximos anos tenham sistema de saúde mais pobre do que o atual, de que as comparticipações possam ser alteradas. Há razões para ter medo sobre como vai ser a evolução do financiamento na saúde nos moldes atuais", afirmou o médico, em declarações aos jornalistas no âmbito do debate "Novas Perspetivas sobre efeitos da crise na saúde", organizado pela Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.
Apesar dos cortes, o responsável diz não existirem ainda "efeitos mensuráveis [dos cortes] dentro das estrutura" hospitalar e sublinha que "os cuidados ainda são os habituais", mas alerta que não está assegurado que continue a ser assim".
"Há muito medo instalado nas pessoas quanto à sua saúde e têm razão para ter medo. O ideal seria que os cortes afetassem apenas o desperdício, mas a realidade não é assim. Afetam sempre a prestação de serviços. Há riscos, seguramente", afirmou.
Agostinho Santos diz que sempre ouviu falar em crise, mas reconhece que esta é "diferente" porque corresponde a "um empobrecimento muito grande do país que vai ter impactos no financiamento da saúde".
"Até há cinco, seis anos, os orçamentos foram sempre subindo, agora deixaram de subir. É natural que cause restrições", observou.
O diretor da Faculdade de Medicina defende que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) "não está em causa como instituição", mas está convencido de que "não responderá da mesma maneira", designadamente no tempo de espera para consultas".
A isto soma-se "um problema crónico na população mais pobre, que aumentou" e que passa por não comprar todos os medicamentos prescritos pelo médico.
"Não é raro prescrevermos três medicamentos e o doente, na farmácia, comprar apenas um ou dois e perverter o tratamento. Dizem-me que está a aumentar. Não custa imaginar que, com o envelhecimento da população, isto venha a ter impactos", avisou.
A questão, explica, é que para as pessoas "que vivem no limiar", qualquer aumento de custos, "que até pode nem ser na saúde, mas na alimentação", "tem impacto na saúde".
"Temos de garantir que o sistema é sustentável. Caso contrário, podemos gritar, podemos discutir, podemos indignar-nos, mas o sistema estoura por ele próprio e ficamos sem nada", defendeu o presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de S. João, António Ferreira.
O administrador prefere não falar em despedimentos, mas reconheceu que terá de "dispensar os que não fazem e não querem fazer" e diz que prefere "a implementação de políticas que assentem no reconhecimento e valorização das pessoas por aquilo que elas fazem" em vez de "cortes transversais como cortes de salários iguais para toda a gente".
Alertando para a "inversão dramática da pirâmide etária" nacional, António Ferreira aponta para os próximos anos "um crescimento ainda maior da despesa de saúde".
"Vamos ter muito mais gente a precisar de cuidados e vamos ter muito menos gente a produzir riqueza. Assim, não há sistema que seja sustentável se não implementarmos muitas mudanças", afirma, falando na necessidade de "prescrever os medicamentos mais baratos" e na redução de camas nas unidades "de [doentes] agudos" para as aumentar nos "cuidados prolongados".
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