No Serviço Nacional de Saúde “também somos humanos” e “temos uma saúde mental que precisa de cuidados”

No Serviço Nacional de Saúde “também somos humanos” e “temos uma saúde mental que precisa de cuidados”
Foto: Ana Torres | Porto Canal
| País
Catarina Cunha

“No Serviço Nacional de Saúde, esquecemo-nos que os profissionais também são pessoas, também ficam doentes e precisam de ajuda”. A frase de Maria João Nobre pairou no ar como de um grito de ajuda se tratasse e só foi interrompida pelos pingos da chuva que começavam a cair no banco verdejante, situado no centro da Praça da Batalha, no Porto.

“Há muita pressão, é preciso dar resposta”, retoma a profissional de saúde com ar relutante.

Médica de família num centro de saúde no Algarve foi diagnosticada, tardiamente, com ‘burnout’ depois de dois anos a carregar uma camisola que a levava a ter uma vida “sempre em pressão e sempre em contrarrelógio”. Um gesto que se transformou numa “normalização do problema”, cada vez mais penoso.

O acumular de “pequenas frustrações” diárias fez com que Maria fosse ‘engolida’ por uma “fadiga acumulada”. Este comportamento, levou-a “a não ter empatia com as situações que os doentes partilhavam” no consultório, a despreocupar-se com a rotina diária e a ficar sem energia para erguer-se da cama e enfrentar mais um dia de trabalho.

A responsabilidade perante os seus doentes obrigava a médica nortenha a continuar a ceder, constantemente, e em esforço, prejudicando o seu tempo útil e agravando as suas condições de trabalho.

Assume, sem exatidão quântica, que “pelo menos uma hora” extraordinária por dia fazia, devido aos ‘atropelos’ das consultas e à ‘avalanche’ de burocracia que aparecia, em cima da secretária, diariamente.

“A ideia romantizada” que tinha da medicina, desde miúda, foi rompendo-se, a balança desequilibrou-se e a frustração começou “a pesar mais do que aqueles momentos em que senti que fui importante para a vida das pessoas”, lembra Maria Nobre.

Tentou incessantemente encontrar refúgios, ofuscando a realidade que vivia quando entrava ao serviço, como se vestisse a capa de um ‘super heroi’.“Saía do trabalho e ia jantar com amigos”, “achava que era capaz de resolver tudo” sozinha, visto que enquanto médica tinha “todo o conhecimento teórico”.

 
 
 
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Quando perdeu a luz ao fundo do túnel, procurou ajuda. A psicoterapia deu-lhe um diagnóstico - que foi recebido por Maria “sem surpresa” - e mais tarde um ‘respiro de alívio’.

A partir daí, o sonho de impactar a vida dos outros teve necessariamente que ficar em suspenso, aliás, nessa altura, o ‘poço’ era tão fundo que a profissão que carregava já não lhe trazia qualquer satisfação. “Sentia que estava a colocar em risco a qualidade do meu trabalho”, comenta.

A falta de apoio e a saída do SNS

O diagnóstico foi o início de uma nova fase para Maria Nobre, há muito esperada. Com uma certa mágoa no olhar explica ao Porto Canal que quando sinalizou a sua situação clínica às chefias “não senti apoio”, mas sim uma notória desvalorização. Essa banalização, tornou-se numa rampa para “questionar se continuar no SNS faria sentido para mim”. Pouco depois, a resposta chegou.

Mudou de ‘casa’ e fechou as portas a uma profissão que nunca pensou abandonar. Depois do ‘salto’, teve de imediato “uma sensação de alívio”, uma vez que ‘atirou’ ao chão a camisola da pressão. Ao mesmo tempo, invadia-lhe um sentimento de perda por deixar a medicina e não ter planos para traçar no futuro, que até então era visto por Maria como uma tela em branco.

Após seis meses de pausa, regressou ao mundo do trabalho e abraçou, novamente,a área da saúde mas, desta vez, em moldes diferentes. “Voltei a trabalhar como médica num serviço de urgência, porque lá está, pensava que não conseguia fazer mais nada”, justifica a profissional de saúde, acrescentando que já "tinha mais claro os meus limites”.

Entretanto, descobriu a “motivação de querer ajudar os outros” fora da medicina, após fazer um mestrado em Gestão de Cuidados, área em que atualmente trabalha. O ‘bichinho’ pela área da saúde não murchou na totalidade, por isso, casualmente, ainda ‘mata’ as saudades ao fazer alguns turnos numa clínica.

Apesar da paixão pelo ‘seu primeiro amor profisisonal’ residir, Maria Nobre reconhece que, hoje em dia, não se sente capaz de encabeçar a missão de ser médica a full time. “Não vou dizer que nunca mais vou ser médica a tempo inteiro, não sei, neste momento não é esse o meu plano, pelo menos a curto prazo”, confessa, afirmando que ao longo desta curta paragem aprendeu a valorizar certos sinais e a despir a tal capa de ‘super herói’, que outrora pensava que seria um sinal de fraqueza.

A chuva continua a correr pela cidade do Porto e a cobrir o chão de poças. O cheiro que sai dos cafés denuncia a hora que se aproxima: o almoço. Maria despede-se, sem a certeza se algum dia a vida lhe dará uma resposta mais concisa quanto à sua relação com a medicina.

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