Legislativas 2015

"O dia seguinte"

José Palmeira - 16-09-2015 15:49:08

Sucedem-se as apostas sobre quem será o próximo primeiro-ministro e as escolhas recaem, invariavelmente, sobre dois nomes: Pedro Passos Coelho ou António Costa. Este é, sem dúvida, o cenário mais provável, mas não se deve excluir uma hipótese alternativa.

Se se confirmarem as estimativas de sondagens e estudos de opinião, não só não haverá maioria absoluta de nenhuma das candidaturas nas eleições do próximo dia 4 de outubro, como as duas mais votadas terão resultados muito próximos. Isso significará que poderá não ser fácil à candidatura vencedora conseguir formar um governo com apoio maioritário no Parlamento - como o Presidente da República (PR) não se tem cansado de pedir – e que se pode chegar a uma situação de impasse na formação do próximo executivo.

A saída democrática para um problema desta natureza é a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições legislativas antecipadas. Acontece que nem o atual Presidente, Cavaco Silva, terá poderes para isso, dado que está no último semestre do seu mandato, nem o próximo PR, que tomará posse em março de 2016, estará em condições de o fazer nos primeiros seis meses do seu mandato, isto é, até setembro.

Face a estes condicionalismos constitucionais, é natural que a formação do próximo governo seja rodeada de especiais cuidados dado que o seu derrube na Assembleia da República antes de setembro de 2016 obrigará sempre a que a alternativa seja gerada pelo Parlamento que será eleito em outubro próximo.

Nos termos constitucionais, o PR deve atender aos resultados eleitorais e ouvir o Conselho de Estado antes de indigitar o próximo chefe do Governo. O cenário tradicional é dirigir esse convite ao líder da candidatura com maior representação parlamentar. A rejeição do programa de governo pela Assembleia da República (AR) pode precipitar uma crise política, dado que a alternativa terá que ser encontrada pelo Parlamento recém-eleito, pelo menos até setembro de 2016.

Uma situação de quase empate entre as duas principais forças partidárias fará com que um compromisso entre as duas seja muito difícil de alcançar. A experiência demonstra que a força coligada minoritária sai sempre prejudicada porque não só não recolhe os benefícios quando a governação corre bem, como lhe são assacadas as maiores responsabilidades em caso de insucesso, dado que serviu de muleta a esse executivo. Os exemplos abundam, sendo os mais recentes os casos dos Liberais Democratas que estiveram coligados com os Conservadores, no Reino Unido, e o PASOK que esteve no poder com a Nova Democracia, na Grécia. O mesmo se passou com os social-democratas alemães (SPD) que estando no governo dirigido por Angela Merkel há dois mandatos quase que eram dispensados na atual legislatura dado que a coligação da chanceler (CDU/CSU) esteve muito perto de alcançar sozinha a maioria absoluta.

Por isso, o bloco central dos anos oitenta do século passado, juntando PS e PSD, dificilmente será reeditado na próxima legislatura. Também um governo minoritário poderá ver o seu programa rejeitado logo à partida. A hipótese de um consentimento da sua passagem e de um afastamento mais tarde, através da aprovação de uma moção de censura, é mais remota, dado que o eleitorado costuma penalizar mais quem interrompe um ciclo governativo. Recorde-se que foi isso que se passou quando o primeiro executivo de Cavaco Silva foi derrubado no Parlamento, em 1987, seguindo-se-lhe duas maiores absolutas do PSD. Diferentes foram as situações em que houve pedidos de demissão dos primeiros-ministros, como aconteceu tanto com António Guterres (2001) como com José Sócrates (2011), tendo, em ambos casos, o PS perdido as eleições seguintes para o PSD que acabou coligado com o CDS-PP.

Quando a conjuntura económica é mais favorável – e a próxima aparentemente poderá sê-lo, até porque irá começar a jorrar a torneira dos fundos comunitários – é mais fácil a um governo minoritário gerir o ciclo político de forma a sair por cima quando derrubado. Por isso, para oposição com ambição ao exercício do poder será mais conveniente rejeitar o programa do novo governo do que apresentar mais tarde uma moção de censura.

Este pragmatismo pode chocar quem considere que os partidos políticos devem colocar os interesses nacionais acima dos objetivos partidários, mas acontece que excetuando os períodos de crise profunda (e já os houve) é essa a lógica que costuma imperar.

Não é indiferente para esta análise saber qual a cor partidária que irá sair vitoriosa a 4 de outubro. Se for o centro-direita terá mais dificuldade em enveredar por uma solução minoritária dado ser maior a probabilidade de chumbo na AR. A coligação PSD-CDS não deverá encontrar aliados para sustentar um governo nessa circunstância. O centro-esquerda tem mais margem de manobra, dado que um governo minoritário do PS poderá receber o benefício da dúvida por parte da oposição de esquerda. Também é verdade que dificilmente esse apoio se manteria num quadro em que o executivo socialista tivesse que prolongar (ainda que de forma aliviada) as políticas de austeridade, em função dos constrangimentos orçamentais impostos por Bruxelas.

Por isso mesmo, e só perante um resultado de quase empate entre Portugal à Frente e o PS é que uma solução alternativa poderá emergir, com um primeiro-ministro que não seja o líder de nenhuma das duas candidaturas mais votadas. Naturalmente que esta hipótese colocaria a questão de saber-se qual seria a personalidade merecedora desse crédito para formar governo com apoio parlamentar maioritário e o beneplácito do PR. À partida, alguém com o perfil de Guilherme d’Oliveira Martins, em caso de vitória do centro-esquerda, ou de Vítor Bento, se a vitória sorrir à atual maioria, poderia reunir condições para o efeito, podendo esse executivo refletir na sua composição a representatividade dos partidos apoiantes no Parlamento.

Uma solução desta natureza teria, obviamente, que ser aceite pelo próprio indigitado, tanto mais que o seu mandato poderia ser limitado até à convocação de eleições antecipadas, possíveis a partir de setembro de 2016.

Como se referiu no início, este cenário, embora possível, não é muito provável, por várias razões. Os partidos são ciosos do exercício do poder, não só por razões de convicção ideológica como também pelas vantagens que isso costuma representar para os seus apoiantes. O próprio Cavaco Silva já demonstrou não ter simpatia por este tipo de recurso, o qual embora não afaste os partidos retira-lhes margem de manobra.

Quanto aos mercados, essa entidade um quanto ou quanto abstrata que julga a credibilidade dos executivos e, em função disso, lhes melhora ou dificulta a vida, não deveriam ficar preocupados se vissem o nome do atual Presidente do Tribunal de Contas ou o do economista e conselheiro de Estado supracitado à frente do Governo.
Mas já basta de especulação!

 

José Palmeira
Centro de Investigação em Ciência Política
Universidade do Minho

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