“Querem que eu vá para a rua”. Idosa em risco de ser despejada por instituição social no Porto

“Querem que eu vá para a rua”. Idosa em risco de ser despejada por instituição social no Porto
Foto: Alexandre Matos | Porto Canal
| Porto
Catarina Cunha

Alice Correia está em risco de ficar sem teto, depois de ter sido alvo de uma ordem de despejo desencadeada pela AMI - Assistência Médica Internacional, atual arrendatária do apartamento onde vive há cinco anos. A idosa já fez quatro pedidos de habitação à Domus Social, mas não obteve pontuação suficiente. Sem retaguarda familiar, esgotam-se as alternativas de locais onde possa viver.

 
 
 
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No corredor daquele apartamento de tipologia T1 na freguesia de Campanhã, no Porto, amontoam-se os sacos repletos de roupa e outros pertences pessoais que escrevem o passado de Alice Correia.

A reformada de 66 anos procura ocupar a sua mente com o tratar das plantas que ocupam, de forma organizada, o parapeito da janela da sala, que tem como pano de fundo a rua da Lomba.

Depois da morte do seu “pilar”, o marido, a portuense vive com a sua cadela “Nina” de nove anos, que trata “como se fosse uma filha”, num imóvel arrendado à AMI, uma instituição que existe há 40 anos e presta acompanhamento social a cidadãos de todo o país.

De 2017 a 2019, a inquilina vivia no rés-do-chão de um prédio contíguo ao Centro Porta-Amiga da AMI, situado na rua da Lomba, e pagava 180 euros de renda. O contrato de arrendamento daquela casa foi celebrado pelo prazo de cinco anos, sendo renovável pelo período de um ano.

No final de 2019, o teto na zona da cozinha aluiu, devido “ao estado em que vivia o inquilino do primeiro andar” e deixou de ter condições básicas de habitabilidade, sobretudo de segurança e higiene.

Desta forma, para as obras de reabilitação serem levadas a cabo, algo que até ao momento ainda não aconteceu, a moradora teve que desocupar a habitação e ser realojada. Foi aí que se mudou de malas e bagagens para o TI localizado no Centro Porta-Amiga, uma viagem curta já que esse apartamento é vizinho do seu antigo ‘lar’.

Relativamente aos atrasos da empreitada, a organização sem fins lucrativos justifica-se, em resposta ao Porto Canal, com a subida do preço dos materiais de construção e com “o crescente aumento do número de pessoas em situação de vulnerabilidade económica”, cenário que a obrigou a canalizar os recursos financeiros para a ajuda humanitária.

Inquilina viveu meses sem luz e água

Após a entrada na sua nova casa, Alice Correia viu ser-lhe negado o pagamento das rendas, circunstância que se mantém até aos dias de hoje. “Não querem o meu dinheiro, querem pôr-me na rua”, declara resignada.

Sabendo das fragilidades económicas da residente, a AMI opôs-se à renovação automática do contrato de arrendamento em junho de 2020 e em julho de 2023. No final de janeiro de 2024, o contrato de arrendamento acabou por cessar, definitivamente.

Após dois meses, deu entrada uma ação de despejo no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, ainda em curso, aguardando-se o agendamento da audiência de julgamento. Ao Porto Canal, a AMI assegurou que “sempre procurou resolver toda esta situação da melhor forma possível e sem recorrer à via judicial”.

Revoltada com a situação em que vive, a idosa vai preenchendo a pequena mesa redonda da sala de jantar com uma pasta onde estão dezenas de documentos que comprovam a sua luta por uma casa: cartas relativas à ação de despejo; correspondência associada ao processo em tribunal; e a documentação relacionada com os quatro pedidos de habitação social na Domus Social (empresa municipal de habitação). “Isto, tem sido uma guerra”, exclama, enquanto guarda as provas que ‘pintam’ a sua história.

A meia dúzia de baldes de água que ocupam o chão da sua sala de jantar denunciam a realidade vivida pela munícipe até à semana passada. A moradora viu ser-lhe cortado o fornecimento de luz e o abastecimento da água, durante cerca de meio ano, um ato que limitou a sua rotina diária, nomeadamente a higiene pessoal, e condicionou a recuperação da cirurgia ao joelho direito.

“Sofri muito ao carregar os baldes de água, até emagreci”, desabafa a reformada, contando que “tomava banho na casa de amigas ou ia à Associação de Moradores da Lomba”.

As refeições diárias têm de ser feitas num restaurante ao pé do apartamento, uma vez que a cozinha do mesmo não possui condições mínimas para confeccionar seja que alimento for. “É uma miséria. Não tenho exaustor e chove lá dentro, por isso os eletrodomésticos não podem estar ligados”, lamenta.

A AMI contrapõe a elevada degradação do espaço, argumentando que o mesmo à data do realojamento estava em “melhor estado de conservação” que a anterior habitação de Alice Correia. “O novo imóvel tinha sido recentemente alvo de obras e tinha-se adquirido de mobília completamente nova”, lê-se na nota enviada ao Porto Canal.

Quatro pedidos de habitação à Domus Social

Auferindo 600 euros de reforma, o futuro da idosa continua incerto e sem meios económicos para pagar as rendas atualmente exigidas num mercado de arrendamento volátil e impiedoso.

Face à sua situação, a portuense formalizou quatro candidaturas (em 2021, 2022 e duas em 2024) a uma habitação social em regime de arrendamento apoiado, “que não obtiveram a pontuação mínima exigida para a admissão”, confirmou o Porto Canal junto da Câmara do Porto.

Sem retaguarda familiar, uma vez que os seus dois filhos não têm condições habitacionais para alojar a mãe, esgotam-se as soluções da munícipe por um teto para viver. “Já não tenho cabeça para tanta coisa. Aqui, estou sempre com medo que me coloquem daqui para fora”, diz, angustiada. De tudo o que tem enfrentado nos últimos meses, Alice Correia continua a ter energia e esperança para o que aí vem. “Só quero o meu sossego”, remata com um longo suspiro.

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