Processo arquivado. Caso dos alunos de Famalicão proibidos de frequentar Cidadania
Porto Canal / Agências
O Ministério Público no Tribunal de Família e Menores de Vila Nova de Famalicão arquivou o processo de promoção e proteção de dois alunos proibidos pelos pais de frequentarem a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento.
O anúncio do arquivamento foi feito pelos pais dos alunos, Artur Mesquita Guimarães, numa publicação em que refere que “imperou o bom senso”.
Artur Mesquita Guimarães diz que foi notificado esta quarta-feira do arquivamento e agradece a todos quantos se juntaram à família na defesa dos seus direitos, liberdades e garantias, no que se refere à educação dos filhos.
Fica, assim, sem efeito a audiência que estava marcada para sexta-feira, para decidir o futuro dos alunos.
Na terça-feira, o pai dos alunos, Artur Mesquita Guimarães, disse à Lusa que já foi interposta uma queixa-crime, por difamação, contra o procurador do Ministério Público responsável pelo processo, face ao teor das alegações que lavrou.
“São alegações manifestamente difamatórias, que não podíamos, de forma alguma, deixar passar em claro”, referiu.
Em causa estão dois alunos, irmãos, que frequentam o Agrupamento de Escolas Camilo Castelo Branco e cujos pais os impedem, desde o ano letivo 2018/2019, de frequentarem a disciplina Cidadania e Desenvolvimento.
Os pais alegam objeção de consciência, defendendo que a educação para a cidadania é uma competência deles.
Sublinham que lhes suscitam “especiais preocupação e repúdio” os módulos “Educação para a igualdade de género” e “Educação para a saúde e sexualidade”, que fazem parte da disciplina em questão.
Dizem ainda que os restantes módulos da disciplina são uma “perda de tempo”.
Nos últimos quatro anos, os alunos, que são de excelência, foram dados como “chumbados”, por causa das faltas àquela disciplina, mas, por decisão do Ministério da Educação, têm transitado de ano, de forma condicionada, enquanto se aguarda pelo desfecho dos processos judiciais relacionados com o assunto, que correm nos tribunais administrativos.
Entretanto, o caso chegou também ao Tribunal de Família e Menores de Vila Nova de Famalicão, tendo o procurador responsável pelo processo, nas alegações que apresentou, pedido que os dois alunos fossem colocados à guarda da escola durante o período escolar.
“A medida que se configura como efetivável a ultrapassar o impasse da situação de perigo, passado, presente e futuro, será a de confiança a pessoa idónea, no concreto circunstancialismo, a confiança dos jovens à entidade mais indicada para o concreto perigo: a própria Escola. A colocação dos jovens, apenas durante o período escolar, sob a guarda da própria escola”, refere o MP.
Especifica que a escola, na pessoa do diretor do Agrupamento de Escolas Camilo Castelo Branco, Carlos Teixeira, e/ou da interlocutora da primeira linha, a psicóloga Marta Silva, “serão as pessoas de quem se não duvida da idoneidade, até pelas funções que lhes estão confiadas”.
O MP considera que os pais “põem em perigo” a formação, educação e desenvolvimento dos filhos, adiantando ainda que há o perigo de os jovens sofrerem “maus-tratos psíquicos”, “não receberem os cuidados ou a afeição adequados às suas idades” e “estarem sujeitos a comportamentos dos pais que afetam gravemente o seu equilíbrio emocional”.
Além disso, acrescenta o MP, há o perigo de retenção e de consequente dificultação de acesso ao ensino superior, quando em causa estão “alunos de excelência, com um percurso académico irrepreensível”.
Diz que fica também em perigo a formação em matérias como direitos humanos, igualdade de género, saúde, sexualidade, segurança, defesa, paz e bem-estar animal, entre outras.
O MP considera que a atitude dos pais pode configurar “coerção emocional”, além de dar “exemplo de foras da lei, que decidem não cumprir, decidindo em causa própria como se juízes fossem”.
“Atuam como agentes de infrações”, acrescenta.
Alerta ainda que os alunos em questão podem ser vítimas de ‘bullying’ por parte da restante comunidade escolar que respeita as leis, “o que já vem acontecendo nas redes sociais”.
“Os pais parecem ignorar que a criança ou o jovem é um ser autónomo, com autonomia jurídica”, lê-se ainda nas alegações do MP.
O JN noticia esta quarta-feira, na sua edição online, que o procurador que lavrou estas alegações foi afastado do processo e que a sua substituta se decidiu pelo arquivamento, por não haver risco para os menores.
O caso fica, assim, nas mãos dos tribunais administrativos, a quem caberá decidir sobre o percurso escolar dos alunos em causa.