Lisboa, 28 jun (Lusa) - O ex-inspetor da Polícia Judiciária Marques Monteiro queixou-se hoje da insistência dos deputados e familiares das vítimas em perguntas sobre o caso Camarate, advertindo que está doente, com problemas de memória e que já disse tudo.

"Tudo o que sei de Camarate está escrito. Não sei que hei de fazer mais, eu até era admirador Sá Carneiro e votei no PSD. Que é que posso fazer? Estou com os 'pés p`ra cova', estou doente, só gostaria que houvesse compreensão", pediu Marques Monteiro, de 83 anos, numa declaração inicial na comissão de inquérito.

Aparentemente debilitado, o ex-inspetor foi hoje ouvido durante duas horas na comissão de inquérito ao caso Camarate, à qual compareceu acompanhado da mulher, numa audição que teve momentos de alguma tensão.

Marques Monteiro foi um dos inspetores que investigou a queda do avião em Camarate e já tinha prestado depoimento em duas anteriores comissões de inquérito.

Hoje, o ex-inspetor remeteu insistentemente os deputados para esses esclarecimentos e para os registos da investigação policial, advertindo para as dificuldades que disse sentir no presente.

Ao contrário dos deputados do PSD, do CDS-PP e dos representantes dos familiares das vítimas, o deputado do PS João Paulo Pedrosa rejeitou fazer qualquer pergunta perante "as circunstâncias difíceis do depoimento".

O ex-inspetor, que disse já não se lembrar se foi ao aeroporto na própria noite da queda do avião ou no dia seguinte, defendeu que todos os elementos "foram explorados", apesar de admitir que já não se lembra de tudo o que registou durante a investigação.

Marques Monteiro disse que a investigação policial foi feita de forma séria e rejeitou qualquer pressão, manifestando-se ofendido perante a forma como algumas perguntas foram feitas.

"Se me está a ofender, isso não aceito. Eu o que digo sou sincero e honesto, se me lembro, lembro, se não me lembro não me lembro", respondeu Marques Monteiro a Luís Filipe Rocha, representante de familiares das vítimas.

Outro momento de tensão ocorreu na sequência das perguntas de Alexandre Patrício Gouveia, representante de familiares das vítimas, sobre o conhecimento que tinha da mala de Adelino Amaro da Costa.

O PSD já tinha questionado Marques Monteiro sobre uma mala que Adelino Amaro da Costa transportava a bordo do avião, com o ex-inspetor a responder primeiro que tinha "ouvido falar" mas que não se recordava de mais, remetendo para os registos da investigação policial.

Mais à frente, Marques Monteiro respondeu a Patrício Gouveia que se lembrava da mala mas não sabia indicar quem teria ficado com ela.

"Se houve alguma coisa da mala, eu escrevi. Eu não fazia as coisas aereamente", disse.

"A tal mala continha documentos tráfego de armas e da CODECO. Lembra-se agora melhor da mala?", questionou Patrício Gouveia, com Marques Monteiro a responder que o facto de se lembrar da mala não tem nada a ver com o seu conteúdo, que desconhecia.

Marques Monteiro foi também confrontado por Patrício Gouveia com acusações de José Esteves sobre a participação do ex-inspetor num alegado encobrimento do crime pela Polícia Judiciária.

"Ele mente, quem me conhece não acredita nisso", respondeu Marques Monteiro, negando também que tenha alguma vez dito a José Esteves para "desacreditar e escarnecer" o trabalho das comissões de inquérito.

"Eu não aguento, eu peço perdão mas eu vou-me embora", pediu Marques Monteiro perto do final da segunda ronda de perguntas, afirmando que não o deixam em paz, ao fim de 30 anos.

"E quem não o deixa em paz?", questionou ainda o deputado do PSD Pedro do Ó Ramos.

"As comissões", respondeu o ex-inspetor. A audição ainda prosseguiu com mais algumas perguntas, tendo terminado ao fim de duas horas.

A x comissão de inquérito ao caso Camarate investiga as causas e circunstâncias da queda do avião que caiu a 4 de dezembro de 1980 num bairro da freguesia de Camarate, vitimando o então primeiro-ministro Sá Carneiro, o ministro da Defesa Adelino Amaro da Costa.

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