Concessão da água de Barcelos pode ter sido "intencionalmente mal pensada"
Porto Canal / Agências
Barcelos, 28 fev (Lusa) - O presidente da Câmara de Barcelos, Miguel Costa Gomes (PS), admitiu hoje que o contrato de concessão da água e saneamento do concelho terá sido "intencionalmente mal pensado", traduzindo-se num negócio "ruinoso" para o município.
"O contrato da água foi ruinoso, mal pensado, eu diria até intencionalmente mal pensado, até porque o relatório [do Tribunal de Contas] vem precisamente chegar a essa conclusão", referiu o autarca.
O Tribunal de Contas (TdC) fez uma auditoria àquela concessão e, de acordo com o relatório hoje tornado público, concluiu que o processo está marcado por "sucessivas decisões lesivas" dos interesses do município.
"Vem confirmar o que o executivo tem andado a dizer desde que cá chegou. É preciso agora que as pessoas assumam a sua responsabilidade e, acima de tudo, que a justiça funcione", disse ainda o presidente da Câmara de Barcelos.
A concessão, ganha pela empresa Águas de Barcelos (AdB) vigora desde 2005, numa altura em que a Câmara era presidida pelo PSD.
Segundo o relatório do TC, uma ação inspetiva àquele processo realizada pela Inspeção Geral da Administração Local (IGAL) apurou "um conjunto de factos que são suscetíveis de consubstanciarem a prática de ilícitos de natureza administrativa, contraordenacional, criminal e financeira".
O caso passou para o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), que já constituiu 12 arguidos, entre os quais o presidente da Câmara e os vereadores do PSD da altura.
Em causa estão alegados crimes de falsificação de documento, tráfico de influências, participação económica em negócio, corrupção passiva em ato ilícito e abuso de poder.
Segundo o TC, o contrato de concessão assentou em previsões irrealistas de consumos de água, que apontavam para uma subida progressiva, quando o que acabou por se verificar foi uma descida a cada ano que passou.
O contrato prevê a reposição do equilíbrio económico-financeiro da concessão nomeadamente quando os consumos ficassem 20 por cento abaixo dos valores previstos.
Em 29 de junho de 2010, a AdB requereu a constituição do Tribunal Arbitral, com vista à reposição de equilíbrio económico-financeiro da concessão.
O tribunal acabou por condenar a Câmara a pagar, até 2035, uma indemnização total de 172 milhões de euros, em tranches anuais de 5,9 milhões de euros.
A Câmara interpôs no Tribunal Central Administrativo do Norte uma ação para anulação do acórdão arbitral, um processo que ainda corre os seus termos.
Enquanto isso, ficou suspensa a obrigatoriedade de pagamento dos montantes anuais fixados pelo Tribunal Arbitral.
O presidente da Câmara disse hoje que espera que o tribunal declare a nulidade da concessão, sublinhando tratar-se de um "contrato leonino".
Como sublinhou Costa Gomes, a decisão do Tribunal Arbitral significa que os níveis de consumo que estão contratualizados "nunca serão atingidos".
O autarca garantiu que, na altura, a entidade reguladora "recomendava" para não avançar com o contrato, "porque a sua sustentabilidade era muito frágil e não dava garantias de sucesso".
"O executivo de 2005 a 2009 insistiu no processo, não acatou recomendações e o resultado está aí", criticou.
O vereador do PSD Domingos Araújo sublinhou que o relatório do TdC "também culpa o atual executivo do estado das coisas", sendo "extremamente severo quando à questão do congelamento dos preços desde 2010".
Para o social-democrata, "não adianta andar de tribunal em tribunal a tentar resolver uma questão que também é política"
Sublinhou que "o importante agora é fazer a correção dos erros" detetados.
VCP // MSP
Lusa/fim